REBELDIA JUDICIÁRIA E AÇÃO RESCISÓRIA EM MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA
Sendo técnico como se dever ser, não há como
utilizar o termo jurisprudência ao lado das expressões súmula e precedente,
pois a jurisprudência – que confirma uma tendência – não é dotada de eficácia
vinculante. Assim, é importante mencionar o entendimento do Enunciado n. 11, da
ENFAM (que não vincula): “Os precedentes a que se referem os incisos V e VI do
§1º do art. 489 do CPC são apenas mencionados no art. 927 e no inciso IV do
art. 332”.
A 4ª Turma do Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do REsp 1.163.267/RS, entendeu que a
desobediência judiciária não pode ser referendada em detrimento da segurança
jurídica, da isonomia e da efetividade da jurisdição, e firmou o entendimento
de que a sentença rebelde pode ser desconstituída por meio de ação rescisória. [1]
Note-se
que, nesse caso, a Súmula n. 343/STF não obsta o
ajuizamento de ação rescisória, independentemente de haver questão constitucional a ser interpretada. Se a decisão rescindente foi proferida sob a
égide do novo entendimento sumulado e/ou submetido ao rito dos recursos
repetitivos, o dissídio jurisprudencial sobre o tema deve ficar no passado. Em
poucas palavras, sendo a decisão proferida em sentido contrário ao que se
superou por meio de precedente com força vinculante, está-se diante de rebeldia
judiciária.
Assim, por exemplo, se
hoje ainda alguma decisão for contrária ao que se decidiu no recurso repetitivo
(tema 982) do STJ, no qual se fixou a seguinte tese: “Comprovada
a necessidade de assistência permanente de terceiro, é devido o acréscimo de
25%, previsto no artigo 45 da Lei 8.213/1991, a todas as modalidades de
aposentadoria.”, é cabível ação rescisória, com fundamento na hipótese de
manifesta violação à norma jurídica.
Da mesma forma, “fundamentar uma sentença
numa súmula ou num precedente que não corresponde à hipótese sob análise no
processo equivale a ofender a norma consubstanciada na jurisprudência de
observância necessária”.[2]
O CPC/2015, no art. 489, § 1º, V e VI, reforça o
entendimento de que é do julgador o ônus de identificar os
fundamentos determinantes ou demonstrar a existência de distinção no caso em
julgamento ou a superação do entendimento, sempre que invocar jurisprudência,
precedente ou enunciado de súmula. Para Daniel Amorim Assumpção Neves, “os
incisos V e VI do § 1º, do art. 489 do novo CPC criam um dever do juiz, não
sendo legítimo se criar um ônus para a parte onde a lei não o prevê e sequer o
sugere”.[3]
De fato, ao julgador
cabe aplicar o Direito, podendo inclusive aplicar lei não invocada pelas partes[4];
mas a ele não é possível aplicar um enunciado de súmula ou acordo proferido em
julgamento de casos repetitivos à situação fático-jurídica que não corresponde
ao seu alcance, não sem identificar os fundamentos determinantes e a
demonstração da existência de distinção ou superação do entendimento.
Escrito por Diego Henrique Schuster
___________________________________
Bah1: PROCESSUAL
CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA RESCINDENDA. JULGAMENTO CONTRÁRIO A
ENTENDIMENTO SUMULADO NO STJ (SÚMULA N. 289). DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL
SUPERADO. SÚMULA N. 343/STF. NÃO INCIDÊNCIA. SEGURANÇA JURÍDICA. UNIFORMIDADE E
PREVISIBILIDADE DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NECESSIDADE. 1. A principiologia
subjacente à Súmula n. 343/STF é consentânea com o propósito de estabilização
das relações sociais e, mediante a acomodação da jurisprudência, rende
homenagens diretas à segurança jurídica, a qual é progressivamente corroída
quando a coisa julgada é relativizada. 2. Porém, o desalinho da jurisprudência
- sobretudo o deliberado, recalcitrante e, quando menos, vaidoso - também
atenta, no mínimo, contra três valores fundamentais do Estado Democrático de
Direito: a) segurança jurídica, b) isonomia e c) efetividade da prestação
jurisdicional. 3. A Súmula n. 343/STF teve como escopo a estabilização da
jurisprudência daquela Corte contra oscilações em sua composição, para que
entendimentos firmados de forma majoritária não sofressem investidas de teses
contrárias em maiorias episódicas, antes vencidas. Com essa providência,
protege-se, a todas as luzes, a segurança jurídica em sua vertente judiciária,
conferindo-se previsibilidade e estabilidade aos pronunciamentos da Corte. 4.
Todavia, definitivamente, não constitui propósito do mencionado verbete a
chancela da rebeldia judiciária. A solução oposta, a pretexto de não eternizar
litígios, perpetuaria injustiças e, muito pelo contrário, depõe exatamente
contra a segurança jurídica, por reverenciar uma prestação jurisdicional
imprevisível, não isonômica e de baixa efetividade. 5. Assim, a Súmula n.
343/STF não obsta o ajuizamento de ação rescisória quando, muito embora tenha
havido dissídio jurisprudencial no passado sobre o tema, a sentença rescindenda
foi proferida já sob a égide de súmula do STJ que superou o mencionado dissenso
e se firmou em sentido contrário ao que se decidiu na sentença primeva. 6.
Recurso especial provido para, removendo-se o óbice da Súmula n. 343/STF,
determinar o retorno dos autos à Corte Estadual para que se prossiga no
julgamento da ação rescisória. (REsp 1163267/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/09/2013, DJe 10/12/2013).
Bah2: THEODORO JÚNIOR,
Humberto. Curso de direito processual
civil - execução forçada, processos nos tribunais, recursos e direito
intertemporal. vol. 3. 49. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense,
2016. p. 857.
Bah3:
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 8.
ed. Salvador: Juspodivm, 2016. p. 131.
Bah4: REsp
1280825/RJ, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em
21/06/2016, DJe 29/08/2016.
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