PETIÇÃO Nº 9.872 – RS: COMO AFASTAR O CASO CONCRETO DA CAUSA E PERDER O INTERESSE RECURSAL
Poseidon tinha um
filho chamado Procustos, que tinha uma cama de ferro; para adaptar seus
“hóspedes” à cama, ele os esticava ou cortava seus membros. É bem possível que
o mesmo já tenha acontecido com o seu “caso concreto”, para adaptá-lo a uma
súmula ou enunciado, por amor à harmonia plástica da composição!
Na Petição 9.872 –
RS, por exemplo, a discussão sobre a retroação do Dec. 4882/03 é completamente
estranha ao caso que deu origem ao incidente. O recorte descritivo que serviu
de espelho para a interposição do incidente de uniformização perante a TNU dá
conta de um período de trabalho anterior a 05/03/1997, na vigência do Decreto
53.831/1964 (1.1.6). A TNU conheceu e deu provimento ao incidente no que alude
à prática da Súmula 32, notadamente, pela uniformização do entendimento de que
até 05-03-1997 o ruído tolerado é de 80 decibéis.
Contra essa decisão,
o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS dirigiu um incidente ao STJ,
defendendo que: "para o período anterior ao Decreto 4.882/03, deve ser
considerado prejudicial à saúde o nível de ruído superior a 90 decibéis, sendo
que, somente a partir de 2003, é que o nível mínimo para o reconhecimento da
atividade em condições especiais passou a ser de 85 decibéis".
Vejam. Não interessa
para a segurada, que aguarda desde 26.10.06 por uma resposta do Poder
Judiciário, a retroação do Dec. 4882/03 para um período anterior a sua
vigência, isto é, quando vigente o Dec. 2.172/97. Em poucas palavras, se
confirmada a (im)possibilidade de retroação do Dec. 4882/03, a tese em nada vai
afetar o caso concreto, que continua amarrado à cama, sem conseguir se fazer
ouvir, pois ninguém olha ou fala sobre os fatos, mas só se vê o que falam sobre
eles.
Neste nível, fica
fácil, portanto, verificar que, como a decisão do incidente não trará proveito
algum ao INSS, não existe interesse recursal. Tivesse o recorrente como se
insurgir contra a aplicação do Decreto 53.831/1964 (1.1.6), aplicado para fins
de caracterização da especialidade do trabalho prestado antes de 05/03/1997, um
novo provimento poderia lhe propiciar um resultado favorável. No entanto, nesse
ponto, a decisão da TNU não diverge da jurisprudência dominante do STJ.
Façamos um balanço
disso, com especial atenção para os incidentes de uniformização:
No
que diz respeito aos incidentes de uniformização regional e nacional, terá
interesse em recorrer a parte que tiver sofrido alguma espécie de gravame com a
decisão da turma recursal que deu interpretação à lei federal, em questão de
direito material, divergente daquela atribuída por outra(s) turma(s)
recursal(is) da mesma ou de outra região, ou ainda, em contrariedade à súmula
ou jurisprudência dominante do STJ ou da TNU.
Especificamente em
relação ao incidente de uniformização para o Superior Tribunal de Justiça, o
interesse recursal decorre do gravame imposto pela decisão da Turma Nacional de
Uniformização que acolheu tese jurídica, em questão de direito material,
contrária à súmula ou jurisprudência dominante daquela Corte.[1]
A noção de
sucumbência reforça a necessidade da decisão atacada pelo incidente poder ser
modificada para, sob o ponto de vista prática, proporcionar alguma vantagem
objetiva como, por exemplo, o afastamento da natureza especial das atividades
com exposição a ruído em nível superior a 80 decibéis, na vigência do Decreto
53.831/1964. É de se reconhecer, portanto, que a atividade do aparelho
judiciário está servindo de instrumento protelatório do INSS.
Agora, deixando o
caso concreto de lado ou entre parênteses, se (re)afirmada a tese do STJ (REsp
1.398.260/PR), no sentido de se exigir um nível de ruído acima do qual se
assume o risco potencial de surdez ocupacional, quem estará se afastando da
causa e, também, do julgador são os elementos da coerência e integridade do
direito.
Escrito por Diego
Henrique Schuster
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Bah1:
SAVARIS,
José Antonio; Savaris, Flavia da Silva Xavier. Manual dos recursos nos juizados especiais federais. 6.ed. rev.
atual. – Curitiba: Alteridade Editora, 2017. p. 240-241.
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