AGENTE FISÍCO RUÍDO: CONSIDERAÇÕES ESSENCIAIS PARA UMA ADEQUADA COMPREENSÃO DA FINALIDADE DO BENEFÍCIO DE APOSENTEADORIA ESPECIAL

 

Diego Henrique Schuster*

RESUMO: O tema relacionado ao agente físico ruído pode ser considerado o mais árduo, tanto que poucos, para não dizer pouquíssimos, são os autores que se debruçam sobre um tema tão técnico e complexo, não obstante sua grande importância prática, no sentido de se buscar evitar o dano (surdez ocupacional) e, com muito maior razão, atenuá-lo, mediante a decisão de retirar o trabalhador/segurado mais cedo do meio ambiente de trabalho.

Palavras-chave: Agente físico ruído. Aposentadoria especial. Proteção social.

1 Introdução

            O reconhecimento do tempo de serviço especial com fundamento na exposição do trabalhador ao agente físico ruído é um dos temas mais controversos. A temática é encoberta por conceitos técnicos (uma linguagem inteiramente incompreensível para os leigos), além de disputar espaço com controvérsias judiciárias que, cada vez mais, dizem respeito a decretos, instruções normativas e decisões administrativas, quando não são transformadas em verdadeiras teses acadêmicas. As discussões acabam se sobrepondo sobre os aspectos fundamentais relativos ao risco de surdez ocupacional e a proteção do trabalhador.

Atualmente, o estudo sobre o agente físico ruído ficou mais evidenciado com o julgamento dos Temas 555/STF e 174/TNU, além da afetação do Tema 1083/STJ: “Possibilidade de reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, considerando-se apenas o nível máximo aferido (critério ‘pico de ruído’), a média aritmética simples ou o Nível de Exposição Normalizado (NEN).” Na via administrativa, igualmente, tem-se o Enunciado 13 do CRPS.

2 O risco (de surdez ocupacional) em matéria previdenciária

A aposentadoria especial tem como fundamento a presunção de um dano futuro, podendo o risco ser percebido pelo binômio probabilidade/magnitude. Isso justifica a aplicação, ao trabalhador segurado, dos princípios da igualdade, no sentido de lhe conferir um tratamento diferenciado, e da prevenção (em sentido lato), no sentido de antecipar-se ao dano e internalizar o risco, com vistas à sua proteção.[1]

O risco à saúde ou à integridade física antecede o dano. Aliás, em matéria previdenciária, a convicção de dano futuro precisa restar frustrada faticamente, sob pena de a aposentadoria especial dar lugar a outros benefícios, por incapacidade ou, na falta do segurado, pensão por morte. A nossa referência, portanto, é o risco potencial de prejuízo à saúde e/ou à integridade física, e não o dano.

Segundo Lenio Luiz Streck[2], a “literatura narra o mundo melhor que o direito e a própria história”. O valor cognitivo da literatura é ainda maior diante de situações batidas, mas que ainda não foram interpretadas na sua melhor luz. Quando se fala em dano futuro, por exemplo, vem a calhar a seguinte passagem do livro 1984, de George Orwell:

Um horror localizado ali, num ponto futuro, que antecipava a morte com a mesma certeza com que 99 antecipava o 100. Um destino que não se podia evitar, muito embora talvez fosse possível posterga-lo, graças a um ato consciente e voluntário, por abreviar o tempo de sua ocorrência.

Isso não significa que o resultado está determinado[3], sendo inútil qualquer cálculo de risco. Assim se quer mostrar que o segurado ocupa, no seu trabalho, um lugar que, em razão da exposição a determinados agentes nocivo, coloca em risco sua saúde ou integridade física. A exposição a agentes nocivos, numa relação de causa e efeito, o coloca na reta do dano. É por isso que a prevenção vem no sentido de antecipar-se ao dano, na tentativa de internalizar o risco.

Uma vez aqui se destaca o caráter protetivo das normas previdenciárias. Entendimento contrário representa uma forma de interpretação equivocada geradora de uma consequência ainda mais equivocada. Sendo assim, isso exige do julgador uma postura diferenciada, a saber, orientada para as consequências do risco e/ou do dano que se pretende evitar (e.g.: câncer, surdez, contaminação, etc.).

Apesar de nosso ponto de partida, quanto à caracterização e aos meios de comprovação da atividade, ser a legislação vigente ao tempo da prestação do serviço, existe espaço para se buscar o referencial constitucional, prevalecendo a orientação espelhada na Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos – que nada mais é – e, por isso, é muito – do que uma interpretação hermeneuticamente adequada do art. 201, § 1º, da CF (entendida, à toda evidência, no seu todo principiológico).

O que se exige é “a afirmação técnica que permita a conclusão no sentido de que, ao tempo do exercício da atividade, o segurado se encontrava exposto de modo habitual a agentes nocivos a sua saúde”.[4] Para se compreender o limiar do risco de surdez ocupacional existe um método simples:



O limite de tolerância para o ruído durante uma jornada de trabalho de 8 horas é de 85 dBA, porém o risco de perda auditiva varia de pessoa para pessoa e, ações que busquem a prevenção de perda auditiva devem iniciar a partir do momento que o trabalhador é submetido continuamente a um nível de exposição diária ao ruído superior a 80 dBA considerando jornada de 8 horas.

No julgamento do Tema 555/STF, o Ministro Luiz Fux traz importante reflexão acerca da nocividade da exposição ao ruído, invocando as lições de Elsa Fernanda Reimbrecht e Gabriele de Souza, que tecem valiosas considerações acerca dos efeitos nocivos do agente na saúde do Trabalhador, reconhecendo seus efeitos danosos a partir de 55 dB. Dizem essas especialistas que:

[...] embora a lesão auditiva seja a mais conhecida, este não é o único prejuízo da exposição do ser humano em demasia ao ruído, podendo ocasionar, também, problemas cardiovasculares, digestivos e psicológicos. De acordo com a Organização Mundial de Saúde [...] a partir de 55 dB, pode haver a ocorrência de estresse leve, acompanhado de desconforto. O nível 70 dB é tido como o nível inicial do desgaste do organismo, aumento do risco de infarto, derrame cerebral, infecções, hipertensão arterial e outras patologias. Com relação ao estado psicológico, o ruído altera-o, ocasionando irritabilidade, distúrbio do sono, déficit de atenção e concentração, cansaço crônico e ansiedade, entre outros efeitos danosos. 

O ruído contínuo provoca efeitos nocivos no ser humano, além da sensação auditiva desagradável. Sem as células ciliadas, não há nada onde o som possa refletir, como se você tentasse fazer eco de sua voz no deserto. Vale ilustrar:

 

A Perda Auditiva Induzida por Ruído - PAIR
 - Apresenta perda neurossensorial irreversível, com predominância coclear;
- Exposição prolongada a níveis de ruídos superiores a 85 dB (8 horas);
  - Perda gradual ao longo de 6 a 10 anos;
- Inicia-se nas frequências altas;
- IRREVERSÍVEL pois destrói as células ciliadas.

 



1.                              ondas sonoras chegam as células ciliadas

2.                              convertem as vibrações em correntes elétricas

3.                              levadas para o cérebro através dos nervos auditivo

 

A Organização Mundial de Saúde considera seguro que um indivíduo fique sujeito a, no máximo, 85 decibéis (dB) por um período de oito horas. A cada 5 decibéis aumentados, deve-se reduzir o período de exposição ao som pela metade:

8 h/dia........................................................85 dB

4 h/dia........................................................90 dB

1 h/dia......................................................100 dB

30 min/dia................................................105 dB

15 min/dia................................................110 dB

Ao contrário do que muita gente pensa, não é no tímpano que ocorre a lesão que a longa exposição ao excesso de ruído provoca. Para que o tímpano seja atingido o ruído tem que ser de alto impacto, como o de uma explosão ou de um tiro. A “lesão dos músicos” ocorre nas células ciliadas da cóclea, que são as responsáveis pela transmissão dos impulsos sonoros ao cérebro. É a partir daí que se inicia a perda da audição.

Os sinais da lesão são muito sutis. Começam com zumbidos e a sensação de “ouvido tampado”, e só são percebidos a médio e longo prazo. Apesar dos sinais desta lesão aparecerem após 10 ou 15 anos de exposição.

A doutora Iêda Chaves Pacheco Russo, explica que todas as pessoas precisam de um mínimo de intensidade sonora para que possam escutar, da mesma maneira que possuem um limite máximo de volume sonoro que podem suportar. Por isso, a deficiência auditiva induzida por ruído é detectada quando ocorre alteração permanente entre esse mínimo e o máximo: a pessoa precisa de uma intensidade sonora maior para que possa escutar, e começa a se incomodar com uma pressão sonora menor. Ou seja, a intolerância e a hipersensibilidade ao barulho também são sinais de uma possível perda auditiva.[5]

3 Conceitos, metodologia e prática: uma abordagem multi-transdisciplinar

As medições pontuais costumam não cobrir o conjunto de situações acústicas ao qual está submetido o trabalhador no decorrer de toda a jornada de trabalho, mormente diante de atividades que envolvam movimentação constante. É importante se perceber a diferença entre os níveis de ruído de uma máquina desligada, ligada ou operando, e também entender que muitas e diferentes máquinas ligadas, simultaneamente, proporcionam a combinação de níveis idênticos de ruído, com acréscimo de decibéis.

Nesse caso, é preciso buscar a dose de exposição diária e, posteriormente, calcular o Nível de Exposição Normalizado (NEN), que é o nível de exposição, convertido para uma jornada padrão de 8 horas diárias, para fins de determinação de nível médio ou da dose de exposição. Quando os níveis de ruído forem variáveis, é necessário o cálculo da dose de exposição, a fim de determinar a real exposição do trabalhador ao agente ruído. Ocorrendo, na mesma jornada de trabalho, dois ou mais períodos de exposição a diferentes níveis de ruído, é preciso calcular os seus efeitos combinados ou a dose de exposição diária.

Embora seja comum, é equivocado calcular essa dose de exposição usando o critério aritmético somar e dividir. Isso porque para cada nível de ruído há um tempo máximo de exposição definido em lei, conforme tabela do Anexo 1, da NR-15, no qual, pelo item 6, é possível se encontrar a equação para calcular a dose de exposição diária:

 

Se durante a jornada de trabalho ocorrerem dois ou mais períodos de exposição a ruído de diferentes níveis, devem ser considerados os seus efeitos combinados, de forma que, se a soma das seguintes frações

C1 + C2 + C3 ________51________ + Cn

T1    T2    T3                                            Tn

exceder a unidade, a exposição estará acima do limite de tolerância.",

Na equação acima, Cn indica o tempo total que o trabalhador fica exposto a um nível de ruído específico, e Tn indica a máxima exposição diária permissível a este nível, segundo o Quadro deste Anexo

O resultado da soma das frações é um número adimensional (que pode ser explicitado por meio de um número simples). Esse número também pode ser expresso em porcentagem (probabilidade). Essa será a dose de exposição diária do trabalhador ao ruído. Se o valor decorrente dessa soma for maior ou igual a 1 (um) ou 100%, significa que a exposição ao ruído está acima do limite de tolerância. O citado percentual é estabelecido pela Norma de Higiene Ocupacional – NHO-01, da FUNDACENTRO, em sua Tabela 1, e também na Norma Regulamentadora 15 em seu anexo 1.

É importante registrar que a escala decibel não é uma escala típica — é uma escala logarítmica, o que significa que um pequeno aumento no nível de decibéis corresponde, na realidade, a um grande aumento no nível de ruído. No trabalho publicado pelo Bureau Internacional do Trabalho, Genebra, sob o título Noise at Work, dá-se o seguinte exemplo:

se um som for aumentado em 3 dB num nível qualquer, os seus ouvidos irão dizer que o som quase duplicou de volume. Da mesma forma, se o som for diminuído em 3 dB, os seus ouvidos irão sentir que o volume foi cortado em metade. Assim, um aumento de 3 dB de 90 dB para 93 dB significa que o volume do ruído duplicou. No entanto, um aumento de 10 dB em qualquer nível (por exemplo, de 80 dB para 90 dB) significa que o ruído aumentou dez vezes.

Ainda mais importante é compreender que o ruído pode ter diversas origens, tais como ferramentas (máquinas e manuseamento de materiais), os compressores, o ruído de fundo, etc., o que é comum no interior de um local de trabalho. Aqui ganha destaque a questão dos efeitos cumulativos e/ou sinergéticos dos impactos ambientais.  Para exemplificar:

se duas fontes de ruído num local de trabalho criarem, cada uma, 80 dB por si só, o seu nível de ruído conjunto é de 83 dB (e não de 160 dB). Como tal, ao considerar a quantidade de ruído que duas fontes fazem em conjunto, o nível de ruído duplica.

Se desejarmos identificar todos os problemas de ruído existentes no local de trabalho, devemos medir separadamente o ruído em cada uma das suas origens. Um modo eficaz de medir o ruído no seu local de trabalho consiste na utilização de um sonómetro. Infelizmente, pode ser difícil obter estes aparelhos, bem como o pessoal com a formação adequada para os utilizar.

Diante de níveis variáveis – suponhamos que o formulário indique uma exposição de 70 a 90 decibéis para o mesmo período – tem-se a orientação para a utilização do critério dos “picos de ruído”, ou seja, deve ser considerado o maior nível de ruído no ambiente durante a jornada de trabalho, como decidiu recentemente o juiz federal Antônio Schenkel: “Quando não for possível a aferição do ruído pela média ponderada e tratando-se de período posterior à Lei n. 9.032/95, deve-se utilizar o critério dos picos de ruído (maior nível de ruído no ambiente durante a jornada de trabalho)”. Tal entendimento é adotado pela Tribunal Regional Federal da 4ª Região[6], mas a questão foi afetada no STJ (Tema 1083).

Nesse momento, o tema assume caráter multi-transdisciplinar. Essa tendência é bastante sentida pelos especialistas em Direito Ambiental, que se veem forçados a incursionar em outros temas, ou seja, dada a generalidade e abrangência das questões ambientais, o assunto acaba esbarrando em questões pertinentes a outras áreas do conhecimento, dada a sua transdisciplinaridade.[7] Ricardo Luis Lorenzetti[8] exemplifica: “[...] o desmatamento é analisado desde o ponto de vista econômico, biológico, jurídico. À diferença dos pressupostos anteriores, não são as disciplinas que moldam o objeto, mas sim o problema que convoca as disciplinas com um pouco mais de liberdade”.[9]

Assim, tornou-se necessária a convocação do Engenheiro de Segurança do Trabalho Sandro José Andrioli Bittencourt, para auxiliarem no esclarecimento de algumas dúvidas:

 

a)             Existe alguma justificativa para profissional ou a empresa indicarem diferentes níveis de ruído no formulário para requerimento da aposentadoria especial?

 

Não há justificativa para o profissional não seguir a metodologia que está na NR-15, Anexo I. Tomando como exemplo um mecânico de manutenção, que está exposto a diferentes níveis de pressão sonora durante a jornada de trabalho. Ele faz a avaliação: 70 decibéis, mínimo; 95 decibéis, máximo. Ele não pode indicar que o trabalhador estava exposto a um nível de ruído de 70 a 95 decibéis. Existe um cálculo a ser feito com base no tempo de exposição a cada nível de ruído, o qual se chama “dose”. Se o resultado deste cálculo for superior a 1 ou 100%, significa que o limite de tolerância para uma jornada de trabalho de 8 horas foi ultrapassado.  Considerando a taxa de duplicação de dose do Anexo 1 da NR-15, a cada incremento de 5 dB(A) há a duplicação do nível de pressão sonora (NPS) e  a respectiva redução pela metade do tempo de exposição a este NPS, ou seja: 85 dB(A) - 8 horas; 90 dB(A) - 4 horas; 95 dB(A) - 2 horas; 100 dB(A) - 1 hora e assim sucessivamente até o limite máximo de 115 dB(A), nível este que é considerado pela norma trabalhista como de risco grave ou iminente. Deve ficar bem claro que até este momento não foi calculado o NEN, que deve ser realizado caso a jornada de trabalho do trabalhador seja diferente de 8 horas diárias.

 

O NEN é uma novidade trazida pelo Dec. 4.882/03 e somente é utilizando quando a exposição do trabalhador for diferente de 8 horas por dia. Se o trabalhador fizer menos de 8 horas por dia ou fizer mais de 8 horas por dia é necessário fazer o cálculo do NEN. Se a jornada de trabalho for de 8 horas, o NEN é igual ao nível de exposição Lavg. Nesse caso, não é preciso fazer o cálculo, porém é importante deixar evidenciado que a jornada de trabalho do segurado é de 8 horas diárias ou 40 horas semanais, o que não é a realidade da maioria dos trabalhadores, que se submetem a jornadas de trabalho de 44 horas semanais e alguns ainda até mais do que isto, pois habitualmente realizam horas extras como é o caso, por exemplo, dos Mecânicos de Manutenção. 

 

b)             Então existe diferença entre dose diária e NEN?

 

Sim, o nível de exposição normalizado só será igual à dose se a jornada de trabalho diária for de 8 horas. O NEN é utilizado quando a jornada for diferente de 8 horas. Se a jornada  for de 44 horas semanais, maior, portanto, que 480 minutos por dia, o NEN deverá ser calculado e será, com certeza,  maior que a dose diária. Se o trabalhador fizer horas extras (que é o caso da maioria dos  Mecânicos de Manutenção, por exemplo, que chegam em alguns casos a ficar até 18/20 horas expostos ao ruído),  deve-se calcular o NEN.  

 

c)             O que fazer quando o formulário indica diferentes níveis de ruído?

 

Estes casos são muito comuns naquelas atividades em que o segurado está exposto a diferentes níveis de pressão sonora ao longo de sua jornada de trabalho, como é o caso de Mecânicos de Manutenção, Operadores de Empilhadeira, Supervisores de Produção e outros. Se não houver nenhuma informação sobre o tempo de exposição no LTCAT ou no PPRA, uma das alternativas seria perguntar ao segurado qual o tempo aproximado de exposição em cada um dos diferentes níveis de ruído. Como estas informações são difíceis de se obter, o mais justo seria utilizar o maior nível de pressão sonora, já que o segurado não pode ser punido pela imperícia e negligência da empresa na inobservância  da técnica de medição correta que, a propósito, está definida na norma trabalhista, DESDE 08 DE JUNHO DE 1978 mais especificamente na Portaria 3.214 em sua NR-15, anexo 1, que é o cálculo da dose. Portanto, não pode a empresa, muito menos o profissional de higiene ocupacional, alegarem desconhecimento da técnica correta para a avaliação do ruído e, isto posto, muito menos o segurado ser penalizado por esta omissão.

 

d)             É possível a adoção do maior nível de ruído ou critério do “Pico de Ruído”?

 

Defendemos a possibilidade de se considerar o maior nível de ruído. Como dito anteriormente, se existe uma metodologia definida na norma técnica desde 1978 e a empresa não observou esta metodologia, não é o trabalhador que deve ser penalizado. Inclusive, é dever da Autarquia fiscalizar o devido cumprimento da norma técnica, e se não o fez por omissão ou negligência, que se utilize o maior nível de pressão sonora, em benefício do Segurado. É muito comum, principalmente nos laudos mais antigos e infelizmente em alguns atuais, encontrarmos as seguintes medições de ruído: Trabalhador exposto a ruído variável entre 70 e 90 dB(A). Como já comentado, estes números não representam a exposição ocupacional do trabalhador a este agente físico. A metodologia técnica correta nos ensina que deve ser calculada a dose da exposição ocupacional. Neste exemplo, que de fictício não tem nada, recomendamos então utilizar o maior valor, ou seja, 90 dB(A).

 

Com relação ao pico de ruído, quando o mesmo estiver indicado nas medições, não seria adequado utilizar este índice, pois o mesmo é muito pontual e geralmente medido em um curto espaço de tempo, como exemplo podemos citar o ruído do impacto de um martelo em uma chapa de aço.

 

 Após um processo de decodificação das informações técnicas prestada pelo profissional da área – no intuito de fazer o possível para facilitar a compreensão –, é possível se fazer as seguintes afirmações: a) o trabalhador não pode ser prejudicado em razão de a empresa não seguir a metodologia prevista na norma; b) além de equivocada, a utilização da média aritmética simples pode ser prejudicial ao trabalhador, pois ele pode ter trabalhado exposto ao nível maior por maior tempo; c) em situações nas quais a jornada ultrapassa as 8 horas diárias, é possível que a NEN seja superior a dose diária; d) é possível se calcular a dose aproximada, investigando o tempo de exposição a cada nível de ruído; e e) a adoção do critério do valor máximo sugere uma alternativa mais justa e adequada para solucionar a omissão da empresa e da Autarquia pela inobservância das normas técnicas.

4 Ruído e suas metodologias: a quem assiste o direito de reclamar?

A NHO-01 é mais vantajosa para o segurado/trabalhador, por ser menos tolerante ao risco e, portanto, mais protetiva. No que ela é diferente da NR-15? O tempo máximo diário de exposição, permissível em função do nível de ruído, é menor do que o da NR-15; ela não considera no cálculo as exposições a níveis inferiores a 80 dB(A); se o NEN estiver entre 82 dB(A) e 85 dB(A), a exposição deve ser considerada acima do nível de ação, devendo ser adotadas medidas preventivas a fim de minimizar a probabilidade de que as exposições ao ruído causem prejuízos à audição do trabalhador e evitar que o limite de exposição seja ultrapassado.

Suponhamos que, durante uma jornada de 8 horas, o segurado trabalhou 4 horas exposto a nível de pressão sonora de 76 decibéis e, no restante, a um nível de 90 decibéis. Aplicando o cálculo da dose conforme o anexo 1 da NR-15 e levando em consideração o NPS de 76 dB(A) no cálculo, teremos um ruído de 85,1 dB(A) para um tempo de exposição de oito horas. Vamos supor que, neste caso, a jornada de trabalho do segurado seja de 44 horas semanais. Desta forma teremos que realizar o cálculo do NEN – Nível de Exposição Normalizado, pois a exposição diária ao ruído será diferente de 480 minutos, mais precisamente de 528 minutos. Procedendo o cálculo, teremos um NEN de 85,8 dB(A). Como os efeitos são cumulativos, a dose de exposição de ruído se dilui ao longo da jornada de trabalho. Sendo assim, considerando-se uma taxa de duplicação de dose de 5, um NPS de 90, é possível se considerar o trabalho insalubre. Desse modo, o critério permanência não se aplicada ao ruído, pois o que se tem é a jornada de trabalho diária.

Além disso, a NHO-01 oferece procedimentos alternativos para outros tipos de medidores integradores ou medidores de leitura instantânea, para avaliação de trabalhos com dinâmica operacional mais complexa ou que envolvam a movimentação constante do trabalhador.

Com efeito, ao trabalhador seria razoável impugnar o formulário com fundamento na utilização da NR-15 e/ou da não utilização da metodologia NHO-01. Não obstante, se o PPP não indicar qual metodologia (NR-15 ou NHO-01), a presunção é no sentido de que não foi observada a metodologia correta, vale dizer: em desfavor do segurado. Ou seja, mesmo que o formulário indique um nível de ruído acima do limite legal: “[...] o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade”.[10] Aqui ganha destaque o Enunciado 13 do CRPS.

Atendidas as demais condições legais, considera-se especial, no âmbito do RGPS, a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis até 05/03/97, superior a 90 decibéis desta data até 18/11/2003, e superior a 85 decibéis a partir de então.

 

I - Os níveis de ruído devem ser medidos, observado o disposto na Norma Regulamentadora nº 15 (NR-15), anexos 1 e 2, com aparelho medidor de nível de pressão sonora, operando nos circuitos de compensação - dB (A) para ruído contínuo ou intermitente ou dB (C) para ruído de impacto.

 

II - Até 31 de dezembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NR-15, devendo ser aceitos ou o nível de pressão sonora pontual ou a média de ruído, podendo ser informado decibelímetro, dosímetro ou medição pontual no campo "Técnica Utilizada" do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP).

 

III - A partir de 1º de janeiro de 2004, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na Norma de Higiene Ocupacional 01 (NHO-01) da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do PPP a técnica utilizada e a respectiva norma.

 

IV - Em caso de omissão ou dúvida quanto à indicação da metodologia ou técnica utilizadas para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o respectivo Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) ou solicitada inspeção no ambiente de trabalho, para fins de verificar a técnica utilizada na medição, bem como a respectiva norma.

 

Fundamentação:

 

Súmula 29 da AGU

 

TEMA 174 da TNU

 

Art. 338, §§ 2º e 3º c/c art. 68, § 7º do Decreto 3.048/99.

Por outro lado, o formulário PPP com indicação do responsável pelos registros ambientais, mas com informações completamente divorciadas da realidade, é suficiente para negar o enquadramento como especial.

Abre-se aqui um parêntese para destacar que o Conselho Pleno é um órgão que, assim como a Turma Nacional de Uniformização, tem o papel de uniformizar o entendimento do Conselho de Recursos do Seguro Social - CRSS, última estância na via administrativa. Conforme o art. 3 da Portaria MDSA Nº 116, de 20 de março de 2017, – que aprova o Regimento Interno do Conselho de Recursos do Seguro Social - CRSS , ao Conselho Pleno compete:

I - uniformizar, em tese, a jurisprudência administrativa previdenciária e assistencial, mediante emissão de Enunciados;

II - uniformizar, no caso concreto, as divergências jurisprudenciais entre as Juntas de Recursos nas matérias de sua alçada ou entre as Câmaras de julgamento em sede de Recurso Especial, mediante a emissão de Resolução; e

III - decidir, no caso concreto, as Reclamações ao Conselho Pleno, mediante a emissão de Resolução.

No voto do relator Victor Machado Marini, acompanhado pela maioria, a questão foi analisada com profundidade. Após uma delimitação ainda mais específica e explícita do tema, o que restou uniformizado é o entendimento de que a indicação de ruído acima do limite de tolerância é suficiente para comprovar a especialidade da atividade, cabendo ao INSS prova em contrário. O entendimento fixado nessa decisão resultou na Resolução 26/2018. A didática da exposição e a fundamentalidade do tema justificam a longa transcrição:

 

O INSS não está agindo com a precisão correta e que se espera da autarquia federal, pois ao se deparar com o respectivo formulário preenchido de forma ‘errada’, o INSS nada fez para que o empregador emitisse o documento conforme determina a legislação previdenciária, apenas espera que o segurado consiga de alguma forma obrigar seus então empregadores a lhe entregarem PPP preenchido corretamente, já que não compete ao segurado o preenchimento do formulário.

Entendo que ao invés de emitir carta de exigência ao segurado ou simplesmente negar o enquadramento especial deve a autarquia exercer seu poder de política, além disso, efetuar seu dever em fiscalizar os empregadores em relação ao preenchimento correto dos documentos entregues ao segurado para fins previdenciários, conforme artigo 125-A da lei 8.213/91 que abaixo transcrevo:

Art. 125-A.  Compete ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS realizar, por meio dos seus próprios agentes, quando designados, todos os atos e procedimentos necessários à verificação do atendimento das obrigações não tributárias impostas pela legislação previdenciária e à imposição da multa por seu eventual descumprimento.       (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

§ 1o  A empresa disponibilizará a servidor designado por dirigente do INSS os documentos necessários à comprovação de vínculo empregatício, de prestação de serviços e de remuneração relativos a trabalhador previamente identificado. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

Veja-se o artigo citado estabelece a competência do INSS para realizar através dos seus agentes, quando assim designados, as medidas necessárias para a ‘verificação do atendimento das obrigações não tributárias impostas pela legislação previdenciária’. Ou seja, das obrigações previdenciárias. A Lei nº 8.213/91, a chamada Lei de Benefícios, é o referencial normativo central para saber quais são estas obrigações.

Em razão disto, tem-se que os contornos do poder de política (ou do poder sancionador) do INSS no que diz respeito à documentação que deve ser mantida e/ou medida pelas empresas para os segurados que nela laboram, ou tenham laborado, possam comprovar eventual prestação em condições nocivas à saúde, está diretamente ligado às obrigações previstas na legislação previdenciária para as empresas são o critério de delimitação da competência sancionadora do INSS.

Assim, caso reconhecidos os períodos exercidos em condições especiais e concedido o benefício, o ônus da prova em contrário cabe à autarquia, devendo exercer seu poder de política e fiscalizar os respectivos empregadores à fim de verificar se o ruído informado está ou não correto, aplicando as medidas cabíveis, inclusive podendo revisar os benefícios concedidos caso comprovado o erro na medição do ruído informado no PPP ou formulário específico.

Pelas razões expostas, entende que aos conselheiros do CRSS cabe, ao receber determinado PPP com indicação de exposição a ruído acima dos limites de tolerância impostos pela legislação previdenciária, receber a informação como verdadeira, já que o INSS, quando do requerimento inicial recebeu o formulário, o analisou e não precedendo em seu poder-dever de política de fiscalizar o correto preenchimento da medição do ruído, entende que a medição está correta, pois se assim não fosse, deveria ter fiscalizado o empregador e verificado se as medições estão de acordo com o que determina a legislação.

Ao segurado, não lhe compete comprovar que laborou exposto a ruído excessivo conforme determinada metodologia de aferição do agente nocivo, bastando-lhe apresentar ao INSS o documento emitido pelo então empregador, o qual indica exposição a agente nocivo. Em momento algum  a legislação prevê que o ônus da prova cabe ao trabalhador e tendo ele cumprido com sua obrigação de juntar formulário contendo a indicação de trabalho em condições especiais, o ônus da prova em contraditório recai sobre a autarquia e assim não o fazendo, não poderá o conselheiro do CRSS acompanhar a afirmação do INSS sem que haja qualquer comprovação em contrário nos autos, pois estará confirmando que não houve exposição a ruído acima dos limites de tolerância sem qualquer meio de prova.[11]

Outra não é o entendimento da Turma Regional Suplementar de Santa Catarina. No julgamento da Apelação Cível Nº 5015163-29.2018.4.04.9999/SC, o desembargador Paulo Afonso Brum Vaz destacou que é da empresa, e não do segurado, a responsabilidade pela observância da metodologia recomendada pela NHO-01 para aferição do ruído e que é dever do INSS, por sua ação fiscalizatória, determinar a adequação do formulário PPP às normas de regência (art. 225 do Decreto nº 3.048/99 e art. 125-A da Lei nº 8.213/91). E concluiu:

É inadmissível o Poder Público acolher a documentação particular da empresa, fazendo presumir que a mesma encontra-se em perfeitas condições, e, depois, acenar com falhas técnicas, a fim de sonegar dos segurados benefícios previdenciários, não se podendo penalizar o segurado pela negligência da Autarquia.[12]

Da mesma forma, o Nível de Exposição Normalizado (NEN) – utilizado quando a jornada é diferente de 8 horas – é mais vantajoso para o trabalhador. O Engenheiro de Segurança do Trabalho, Sandro José Andrioli Bittencourt, explica: Se a jornada for de 44 horas semanais, maior, portanto, que 480 minutos por dia, o NEN deverá ser calculado e será, com certeza, maior que a dose diária. Se o trabalhador fizer horas extras (que é o caso da maioria dos Mecânicos de Manutenção, por exemplo, que chegam em alguns casos a ficar até 18/20 horas expostos ao ruído), deve-se calcular o NEN.

Para Adriane Bramante de Castro Ladenthin:

[...] o NEN vem corrigir o nível de ruído ao qual o trabalhador estará exposto caso sua jornada de trabalhado seja superior a 8 horas diárias (horas extras, p. ex.), eliminando assim, interpretações equivocadas por parte de quem quer que seja, interpretações estas que apenas prejudicam o direito do trabalhador ao benefício constitucional da aposentadoria especial.[13]

Agora, novamente, o INSS pretende transferir um “vício” para o segurado, poupando os responsáveis pela emissão e fiscalização dos documentos previdenciários. Do ponto de vista técnico e legal, é equivocada a referência a dois níveis de ruídos diferentes, exemplificando: de 70 a 90 decibéis. Isso porque não se tem a informação do tempo de exposição a cada nível de ruído, tampouco das situações acústicas entre um e outro. Agora, não é justo punir o trabalhador pela “imperícia e negligência da empresa na inobservância da técnica de medição correta que, a propósito, está definida na norma trabalhista, desde 08 de junho de 1978 mais especificamente na Portaria 3.214 em sua NR-15, anexo 1, que é o cálculo da dose”, como conclui o profissional.

Com relação ao formulário PPP que estampar diferentes níveis de efeitos sonoros, o que se defende, com fundamento nos princípios da precaução, do in dubio pro trabalhador/segurado e da proteção social, é que a premissa a nortear o Poder Judiciário seja pela conclusão da asserção mais protetiva da saúde do trabalhador, considerando-se apenas o nível máximo aferido – o que atrai a ratio decidendi do Tema 555/STF.[14] 

Em síntese: se concordarmos com o erro na indicação de dois níveis de ruído, este não pode ser transferido para o segurado; se concordarmos com o erro, quem teria motivos para impugnar o formulário é o segurado, e não o INSS;  se concordarmos com o erro, o mais justo e adequado é a adoção do maior nível de ruído, já que ao julgador é possível acolher a asserção mais protetiva da saúde do trabalhador, com fundamento nos princípios da prevenção (em sentido lato sensu), do in dubio pro segurado, para citar apenas estes; se concordarmos com o erro, o Superior Tribunal de Justiça deverá modular os efeitos da decisão no Tema 1083/STJ, já que inadmissível o Poder Judiciário adotar a tese do "pico de ruído" e, depois, acenar com falhas técnicas, sonegando dos segurados o direito de impugnar o formulário e/ou tentar comprovar o tempo de exposição a cada nível de ruído. O problema, portanto, é transferir um erro para o segurado, ou, na dúvida, desprezar um formulário que indica um nível de ruído acima do limite de tolerância.    

Aqui, de fato, ao bom argumento se deve acrescentar a vontade de proteger o segurado. Não se consegue nada sem as duas coisas. É inadmissível que o INSS continue colocando em dúvida documentos que comprovam o direito do segurado, com todas as implicações que isso tem, mesmo após ter sido omisso na fiscalização da empresa.

5 Tema 694/STJ: e quando o absurdo é de observância obrigatória?

Não se desconhece o precedente do Superior Tribunal de Justiça acerca do nível de ruído acima de 90 decibéis, vale dizer: acima do qual se assume o risco potencial de surdez ocupacional. Pelo contrário. É como advogado e, também, jurista (afinal estudo e escrevo sobre o tema) que não se quer acreditar que esteja tudo perdido e o melhor seja se conformar com ele.

Ele foca no princípio tempus regit actum, e não no caráter protetivo das normas previdenciárias, para declarar a aplicação do Dec. 2.172/97 no período de sua vigência, de 03/1997 a 11/2003. Isso representa uma forma de interpretação equivocada geradora de uma consequência ainda mais equivocada: por uma mera subsunção ao um decreto, permite-se a prolongação do trabalho sob condições especiais, para além de seis (06) anos, a depender do caso – tempo suficiente para se verificar a perda gradual de audição. Essa forma de interpretação traduz uma barreia para eficácia direta dos princípios e normas fundamentais, o que fica claro com o julgamento do Tema 709/STF.

Há muitos motivos para se afirmar isso. Como já se viu, existe espaço para se buscar o referencial constitucional por meio da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos. Por outras palavras, os decretos vigentes ao tempo da prestação do serviço não excluem a Súmula 198 do ex-TFR e, consequentemente, o arcabouço de normas existentes (e.g.: NHO´S, NR´S e ACGIH).

A própria Corte Cidadã, no julgamento do representativo de controvérsia REsp 1.306.113/SC, fixou a tese de que:

as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/1991).

Mas voltando ao precedente do STJ, que tinha como recorte a (im)possibilidade de retroação do Dec. 4.882/2003, mais benéfico. Até mesmo nessa perspectiva, da (i)retroatividade das leis, inúmeras decisões posteriores ao precedente privilegiaram o caráter protetivo da norma. Assim, por exemplo, o Dec. 8.123/2013 emprestou nova redação ao art. 68, § 4º, do Dec.03.048/99, no sentido de a mera presença de agentes reconhecidamente cancerígenos no ambiente de trabalho ser suficiente para a caracterização da atividade como especial, o que passou a orientar a análise de todos os períodos, mesmo anteriores ao Dec. 8.123/2013. No julgamento do tema 170, decidiu-se a coisa mais prosaica do mundo: “A redação do art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/99 dada pelo Decreto 8.123/2013 pode ser aplicada na avaliação de tempo especial de períodos a ele anteriores, incluindo-se, para qualquer período: (1) desnecessidade de avaliação quantitativa; e (2) ausência de descaracterização pela existência de EPI”.

O direito, com certeza influenciado pela ciência, evoluiu para estabelecer uma lista dos agentes confirmados como cancerígenos para humanos. Com o efeito, o segurado não pode ser penalizado por essa demora. É possível se afirmar que a jurisprudência compreendeu a dimensão preventiva e protetiva das normas previdenciárias. A questão que se coloca: como deixar de reconhecer a natureza especial da atividade, sabendo que ela é prejudicial à saúde?

Está cientificamente comprovado que o ruído em nível superior a 85 decibéis implica risco de surdez ocupacional, conforme Norma de Higiene Ocupacional - NHO 01, emitida pelo Ministério do Emprego (FUNDACENTRO)[15], e Portaria 3.214/78 (NR-15). Para sermos honestos, a questão dispensaria perícia judicial (CPC, art. 427) – todo e qualquer manual de TV alerta para os riscos do ruído acima deste limite.

No mito de Sísifo, um ensaio filosófico escrito por Albert Camus, em 1941, o último capítulo conta a história de um homem que, depois de desafiar a morte, é enviado ao Hades e condenado pelos deuses a rolar uma pedra até o alto da montanha, de onde ela desce de novo - e assim eternamente. Nessa metáfora, temos o absurdo no fato de o personagem não se dar conta da inutilidade de sua tarefa.

O absurdo está, portanto, na falta de sentido e, no Direito, são os princípios que emprestam sentido às regras. Nessa perspectiva, o precedente do STJ fixa o ponto de onde o sentido se atirou, em que a coerência se perdeu, por não observar os princípios que fundamentam a concessão do benefício de aposentadoria especial. A coerência é aquela que se refere Dworkin e que foi incorporada ao CPC (art. 926), no sentido de o juiz buscar integrar cada decisão em um sistema coerente que atente para a legislação e para os precedentes jurisprudenciais sobre o tema, procurando discernir um princípio que os haja norteado.

Isso é possível a partir do reconhecimento da especialidade com fundamento na Súmula 198 do ex-TFR, pois somente haverá coerência se os mesmos princípios, da igualdade e da prevenção, para citar apenas estes, que foram aplicados – mesmo quando o próprio operador jurídico pensa estar aplicando, exclusivamente, uma regra e/ou a Súmula 198 do TFR[16] – para reconhecer como especial a atividade prestada com exposição a agentes não constantes da lista exemplificativa do Decreto 2.172/1997 o forem aplicados para os casos onde o nível do ruído é superior a 85 decibéis.[17]

O absurdo fica claro quando se possui inúmeros acórdãos, dando conta de que os decretos previdenciários não excluem a aplicação da Súmula 198 da ex-TFR, – ou seja, independentemente da lei vigente ao tempo da prestação do serviço –, mas a mesma não é aplicada quando reconhecida a insalubridade do ruído acima de 85 decibéis pela perícia judicial, sem compromisso com o Dec. 2.172/97. Quando o STF, no ARE 664.335/SC, reconhece a especialidade do ruído acima de 85 decibéis, com fundamento na dúvida sobre seus efeitos vibratórios e a (in)eficácia do EPI, mas o STJ insiste num ruído de 90 decibéis, mesmo sabendo que o tempo máximo de exposição diária permissível é de 4 horas, metade da jornada de trabalho!

O que se depreende disso tudo é que, quando o tema é caracterização e comprovação da atividade especial em razão do agente físico ruído, estamos também rolando a pedra ladeira abaixo. E já se consegue chegar um pouco antes da pedra! 

Até mesmo na perspectiva do princípio tempus regit actum, entre 03/1997 e 11/2003 estavam em vigor, concomitantemente, o Dec. 2.172/1997 e a Portaria 3.214/1978 (NR-15), Anexo I. Logo, o que se defende é aplicação da norma mais protetiva ou menos tolerante ao risco de surdez ocupacional, devendo, por isso, ser exigido um nível de ruído superior a 85 decibéis. Oportuno lembrar que o art. 188-P, § 6º, do Dec. 10.410/2020 [art. 70, § 1º, do Dec. 3.048/1999] confere normatividade ao princípio em questão.[18]

Decerto, dependemos da “infidelidade” dos tribunais regionais para o STJ melhor medir o que só pertence ao absurdo. Nas notas taquigráficas do julgamento, causa perplexidade a última manifestação do Min. Herman Benjamin: 

Sr. Presidente, permita-me uma observação: fiz questão de dizer que não há precedente de minha relatoria sobre esta tese. Exatamente porque, se houvesse, iria analisar a questão sob outro ângulo. Analisaria a questão e deixei para usar uma expressão vulgar, mas que está na moda, uma "pegadinha" para chamar a atenção dos Colegas. Mencionei, expressamente, o fundamento para esta jurisprudência absolutamente pacificada, que é o art. 4º da antiga Lei de Introdução ao Código Civil, que julgaria com base no art. 5º dessa Lei, que obriga o juiz, em situações como esta, buscar o bem comum, o interesse público.

Há um componente que, se quisermos associar ao fundo constitucional que envolve esta matéria, em que temas afeitos diretamente à dignidade da pessoa humana e à proteção dos vulneráveis e, mais ainda, dos hipervulneráveis, não há propriamente que se falar em retroatividade de um regime que não foi concluído.

Mas fiz essas considerações apenas por desencargo de consciência, e estou trazendo o repetitivo nos termos em que a matéria foi pacificada. Observei, nos precedentes, que a matéria foi debatida.

Então, não é que nesta Seção tivemos um precedente solto e todos passamos a repetir.

Houve efetivamente debate. E de maneira disciplinada eu trago aqui os precedentes dos Colegas e alinho a minha posição, que passa ser absolutamente irrelevante, a essas dos Colegas.

O relator, sem hesitação, assevera que o tema permite uma análise diversa da sugerida em seu voto condutor, reconhecendo a possibilidade de retroatividade da norma em prol da proteção da dignidade da pessoa humana e das pessoas em estado de vulnerabilidade. Contudo, rechaça tal possibilidade, ao mero argumento de que seu voto se limita a reafirmar a jurisprudência já existente sobre o tema.[19] Sobre tal postura, o Ministro Napoleão Nunes Maia, em sua obra Direito ao Processo Judicial Igualitário, traz importante alerta:

Esta é a postura que promove a continuidade do reino da mesmice, tanto na compreensão do Direito, como também na compreensão do processo judicial e das decisões dos julgadores (com a dessaborosa querela sobre se os seus conteúdos resultam da subsunção do caso à regra ou da vontade do magistrado).

O esforço pela preservação do reino da mesmice tornou-se uma espécie de virtude do julgamento ou conspícua credencial do próprio julgador, mesmo se sabendo que essa atitude deixa de fora de proteção os direitos das pessoas, inclusive aqueles que são carimbados e recarimbados com a nota de fundamentais

Quando o julgador já tem opinião formada sobre o caso que vai examinar, que por sua subserviência às regras prévias (legais ou jurisprudenciais), quer pelo compromisso com a mesmice, quer por adotar o comodismo intelectual, quer pela indisposição com o trabalho crítico, a argumentação jurídica que sobre ele (o caso) possa ser desenvolvida, por mais lógica e justa que seja, será sempre vã, inútil e mesmo patética.[20]

Verifica-se, como jurista, a possibilidade de utilização da técnica do distinguishing, naqueles casos em que existe nos autos prova pericial concluindo pela nocividade do ruído acima de 85 decibéis, por atrair a incidência da Súmula 198 do ex-TFR, ou, ainda, no controle difuso, a partir de uma interpretação conforme a Constituição, que deverá ir ao encontro do art. 201, § 1º, da CF/1998, reafirmado pela Lei de Benefícios (art. 57) e, uma vez mais, confirmado pela já referida Súmula.

O magistrado não está obrigado a aplicar um precedente em que não se perquiriu a compatibilidade do ruído exigido pelo Dec. 2.172/97 com a Constituição. Pelo contrário. A ele cabe a atividade judiciante. Não se trata de ignorar a existência de um precedente (de observação obrigatória), mas de uma recusa a sua aplicação diante da necessidade de uma resposta constitucionalmente adequada ao caso concreto.

6 Uma última palavra

            É inegável que o tema está sendo maltratado. Como restar inerte? Estão excluindo os trabalhadores da proteção social, mesmo que incluídos nas consequências prejudiciais do ruído.

Referências

ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

ARE 664335, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015.

BRASIL. Resolução 26. Ministério do Desenvolvimento Socia e Agrário. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/webarquivos/inss/CRPS/jurisprudencia_administrativa/ 08082018_RESOLUCAO%2026%20%20.pdf>. Acesso em 06 mai. 2021.

CARVALHO, Délton Winter de. Aspectos epistemológicos da ecologização do direito: reflexões sobre a formação de critérios para análise da prova científica. In: LEITE, José Rubens Morato Leite (Cord.). Dano ambiental na sociedade risco. São Paulo: Saraiva, 2012.

CARVALHO, Francisco José. Curso de direito ambiental. Curitiba: Juruá, 2010.

CUIDADO com os ouvidos. Cover Guitarra. Edição 41.

GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro: Record, 2002.

LADENTHIN, Adriane Bramante de Castro. Aposentadoria especial: teoria e prática. Curitiba: Juruá, 2013.

LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da decisão judicial: fundamentos de direito. 2. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2008.

MAIA, Napoleão Nunes. Direito ao Processo Judicial Igualitário. Fortaleza: Editora Curumim, 2015.

SAVARIS, José Antonio. Direto processual previdenciário. 6. ed. Curitiba: Juruá, 2016.

SCHUSTER, Diego Henrique Schuster. Aposentadoria especial e a nova previdência: os caminhos do direito previdenciário. Alteridade: Curitiba, 2021.

SCHUSTER, Diego Henrique; WIRTH, Maria Fernanda. A caracterização da atividade especial pelo agente físico ruído: quando o mais importante não importa na formação da jurisprudência de observância obrigatória. Revista Brasileira de Direito Previdenciário, Porto Alegre, v. 9, n. 52, p. 85-105, Ago./Set. 2019. 

STRECK, Lenio Luiz. A resposta hermenêutica à discricionariedade positivista em tempos de pós-positivismo. In: DIMOULIS, Dimitri; DUARTE, Écio Oto (Coord.). Teoria do direito neoconstitucional: superação ou reconstrução do positivismo jurídico? São Paulo: Método, 2008. 

STRECK, Lenio Luiz. Os livros da vida do procurador de Justiça Lenio Streck. Revista Consultor Jurídico, São Paulo, 29 abr. 2014. Disponível: <http://www.conjur.com.br/2014-abr-29/livro-aberto-livros-vida-procurador-justica-lenio-streck>. Acesso em: 30 abr. 2015.

TNU, no julgamento do Tema 174: Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 0505614-83.2017.4.05.8300, SERGIO DE ABREU BRITO - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO.

TRF4, AC 5015163-29.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 13/12/2019.

TRF4, AC 5003137-49.2012.4.04.7205, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, juntado aos autos em 05/02/2018.



* Advogado e pesquisador da Lourenço e Souza Advogados Associados; Mestre em Direito Público e Especialista em Direito Ambiental pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS. Diretor-Adjunto da Diretoria Científica do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário – IBDP.

[1] SCHUSTER, Diego Henrique Schuster. Aposentadoria especial e a nova previdência: os caminhos do direito previdenciário. Alteridade: Curitiba, 2021.

[2] STRECK, Lenio Luiz. Os livros da vida do procurador de Justiça Lenio Streck. Revista Consultor Jurídico, São Paulo, 29 abr. 2014. Disponível: <http://www.conjur.com.br/2014-abr-29/livro-aberto-livros-vida-procurador-justica-lenio-streck>. Acesso em: 30 abr. 2015.

[3] Para ilustrar a diferença da seguinte forma: “Uma piada referida por Antthony Giddens ilustra bem a situação. Nela, um homem salta de um arranha-céu, de mais ou menos cem andares. Durante sua queda, as pessoas que se encontram dentro do prédio ouvem ele dizer que, por enquanto, “está tudo bem”. Ele age como se estivesse fazendo um cálculo de risco. Mas, fatidicamente, o resultado já está determinado.” GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro: Record, 2002. p. 33. 

[4] SAVARIS, José Antonio. Direto processual previdenciário. 6. ed. Curitiba: Juruá, 2016. p. 295.

[5] CUIDADO com os ouvidos. Cover Guitarra. Edição 41. p. 41-42.

[6] Tal entendimento é bem esclarecido em voto do Juiz Federal Hermes S Da Conceição Jr, no qual se ressalta que, em tais situações, "deve-se utilizar o critério dos picos de ruído (maior nível de ruído no ambiente durante a jornada de trabalho). (Reexame Necessário Cível nº 5006767-28.2012.404.7104/RS, julgado em 12.08.2014, unanimidade, Relatora Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, D.E. de 19.08.2014)." (TRF4, AC 5003137-49.2012.4.04.7205, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, juntado aos autos em 05/02/2018).

[7] No âmbito do Direito Ambiental, os doutrinadores estão suficientemente cônscios dessa tendência, diante da generalidade e abrangência das questões ambientais. Francisco José Carvalho explica esse movimento: “[...] o direto ambiental, sendo transdisciplinar, atravessa os demais ramos do direito e também, as ciências sociais. Como uma teia, ele transpassa vários fios diferentes, e em cada ponto se encontra, amarrado, como se fosse um nó, dando um suporte às outras ciências e abstraindo dessas mesmas ciências aquilo que é necessário para a preservação e proteção do meio ambiente”. CARVALHO, Francisco José. Curso de direito ambiental. Curitiba: Juruá, 2010. p. 69. Adverte Paulo de Bessa Antunes que: “Em matéria de direito ambiental, as fronteiras entre os diversos segmentos do conhecimento humano tornam-se cada vez menores. Na análise de uma medida a ser tomada pelo aplicador da lei em matéria ambiental, necessariamente, estão presentes considerações que não são apenas jurídicas”. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 60.

[8] LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da decisão judicial: fundamentos de direito. 2. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2008. p. 342.

[9] Sendo Délton Winter de Carvalho: “Esta nova forma de complexidade é operacionalizada pelo Direito, em grande medida, apenas a partir de uma mediação realizada pela Ciência (laudos técnicos, estudos de impacto ambiental, relatórios de impacto ambiental, avaliação de riscos ambientais, pareceres técnicos, análises laboratoriais, planos de controle ambiental, planos de recuperação de área degrada etc.).” CARVALHO, Délton Winter de. Aspectos epistemológicos da ecologização do direito: reflexões sobre a formação de critérios para análise da prova científica. In: LEITE, José Rubens Morato Leite (Cord.). Dano ambiental na sociedade risco. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 90-91.

[10] No Tema 174, a Turma Nacional de Uniformização fixou a seguinte tese: a) A partir de 19 de novembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NHO-01 da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) a técnica utilizada e a respectiva norma; b) Em caso de omissão ou dúvida quanto à indicação da metodologia empregada para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada na medição, bem como a respectiva norma. (TNU, no julgamento do Tema 174: Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 0505614-83.2017.4.05.8300, SERGIO DE ABREU BRITO - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO).

[12] TRF4, AC 5015163-29.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 13/12/2019.

[13] LADENTHIN, Adriane Bramante de Castro. Aposentadoria especial: teoria e prática. Curitiba: Juruá, 2013. p. 223.

[14] O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664335/SC, deixou registrado que, em caso de divergência ou dúvida acerca da real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, “a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete”.

[15] Os critérios estabelecidos na NHO 01, por exemplo, estão baseados em conceitos e parâmetros técnico-científicos modernos, seguindo tendências internacionais atuais, não havendo um compromisso de equivalência com o critério legal.

[16] Lenio Luiz Streck defende que atrás de cada regra há um princípio que não a deixar se “desvencilhar do mundo prático”. STRECK, Lenio Luiz. A resposta hermenêutica à discricionariedade positivista em tempos de pós-positivismo. In: DIMOULIS, Dimitri; DUARTE, Écio Oto (Coord.). Teoria do direito neoconstitucional: superação ou reconstrução do positivismo jurídico? São Paulo: Método, 2008.  p. 288-289.

[17] Se dermos razão ao STJ, chegaremos à seguinte conclusão lógica: um mero decreto executivo (exemplificativo) vale mais do que a Constituição Federal, que exige tão somente que a atividade seja exercida sob condições especiais que prejudicam a saúde ou a integridade física, orientação consolidada na Súmula 198 do extinto TFR e aplicada pelo próprio STJ, ou seja, restando comprovado que a atividade tem potencialidade de prejudicar a saúde ou a integridade física do trabalhador é devido o reconhecimento da natureza especial, mesmo que os agentes nocivos não estejam previstos nas listas das atividades e dos agentes nocivos, mesmo que algum decreto diga o contrário.

[18] Na questão da poeira mineral, a NR-15, no seu anexo 12, coloca 3 limites para o profissional escolher. Sendo assim, na análise de agentes químicos deve-se avaliar o que tiver menor limite para garantir a segurança do trabalhador.

[19] SCHUSTER, Diego Henrique; WIRTH, Maria Fernanda. A caracterização da atividade especial pelo agente físico ruído: quando o mais importante não importa na formação da jurisprudência de observância obrigatória. Revista Brasileira de Direito Previdenciário, Porto Alegre, v. 9, n. 52, p. 95, Ago./Set. 2019. 

[20] MAIA, Napoleão Nunes. Direito ao Processo Judicial Igualitário. Fortaleza: Editora Curumim, 2015. p. 63.


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