TEMA 995/STJ: O CONTRADITÓRIO PRECISA SER OBSERVADO NA FORMAÇÃO DO QUE VINCULA (OU NÃO) NUM PRECEDENTE DE OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA!

 

O Superior Tribunal de Justiça vem, sistematicamente, afirmando que a matéria relativa aos juros moratórios passou a fazer parte do Tema 995/STJ a partir do julgamento dos embargos de declaração opostos pelo INSS.

Assim sendo, havendo reafirmação da DER no curso do processo, se o INSS efetivar a implantação do benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias, não há que se falar em parcelas vencidas oriundas de sua mora.

Tomamos o exemplo de uma decisão que reafirmou a DER para uma data posterior ao Ajuizamento da Ação Previdenciária (DAA). Vale detalhar:

 

DER 18/03/2015

DAA

03/10/2015

CITAÇÃO

05/08/2016

DATA REAFIRMADA 26/08/2016

 

Tivesse a reafirmação ocorrido para uma data anterior à Data de Ajuizamento da Ação (03/10/2015), os juros de mora seriam devidos desde a citação do INSS (05/08/2016), o que demonstra a irracionalidade da orientação assumida pelo Superior Tribunal de Justiça.

Abre-se aqui um parêntese para referir que, nos casos em que a reafirmação de DER ocorrer para um momento anterior ao ajuizamento da ação, é possível se defender o distinguishing, já que a tese representativa de controvérsia (Tema 995/STJ) trata apenas da possibilidade de reafirmação da DER para momentos posterior à data do ajuizamento, não abrangendo o universo de casos em que a DER é reafirmada para antes dessa data.[1] As técnicas de distinção e superação de precedentes estão previstas nos artigos 489, § 1º V, VI, 966, V, §§ 5º e 6º, 1.036 a 1.041, 1.037, §§ 9º a 13, e 927, §§ 2º a 4º, todos do CPC/2015.

Com a devida vênia, mas, em matéria previdenciária, o marco inicial da incidência de juros de mora não pode depender do descumprimento da ordem para implantação do benefício, vale dizer: como se o INSS não tivesse dado causa ao ajuizamento da ação e, com muito maior razão, à própria reafirmação da DER.

Constituindo-se o direito da parte autora à concessão do benefício em momento posterior ao ajuizamento da ação, o marco inicial da incidência dos juros de mora deverá ser a data em que reafirmada a DER, a partir de quando serão devidos.

É de se ver que a questão dos juros de mora não fez parte da tese representativa de controvérsia (Tema 995), bem assim não foi fruto de um intenso contraditório, logo, o precedente não vincula no ponto. Apenas no julgamento dos Embargos de Declaração, a Corte Especial se manifestou – de forma sucinta – sobre os juros de mora:

Por outro lado, no caso de o INSS não efetivar a implantação do benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias, surgirá, a partir daí, parcelas vencidas oriundas de sua mora. Nessa hipótese deve haver a fixação dos juros, a serem embutidos no requisitório.

Na medida em que tal questão não foi submetida, de forma integral, à consideração das partes e, consequentemente, do STJ, não pode ela vincular decisões futuras. Diferentemente da questão envolvendo o termo inicial dos efeitos financeiros, para qual a qual o STJ já tinha uma sinalização positiva, as afirmações relativas aos juros de mora não encontram ressonância na jurisprudência do STJ. A nova orientação, portanto, não encontra fundamento numa cadeia de julgamentos anteriores, tampouco na opinião da doutrina.

O contraditório deve ser observado na formação do precedente, não apenas em razão do que estabelece o artigo 10, mas principalmente os artigos 926 e 927, § 4º, todos do CPC/2015. Não se pode afirmar que toda a fundamentação lançada pelo STJ participou da formação do precedente e/ou que deve vincular. A questão dos juros de mora extrapolada a tese representativa de controvérsia.[2] No II encontro dos jovens processualistas do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), ocorrido em Salvador nos dias oito e nove de novembro de 2013, foi aprovado o enunciado segundo o qual “para a formação do precedente, somente podem ser usados argumentos submetidos ao contraditório”.

No mérito, tal entendimento representa um ataque contra o princípio da causalidade, o conceito de causa e efeito, pois as consequências de uma ação já não são vistas como uma forma de acertamento, em razão da atuação descomprometida do INSS, mas como um favor da Autarquia. É evidente que o INSS, mesmo após defender uma orientação institucional abusiva e protelatória, desde a via administrativa e/ou citação no processo, agora só precisa “concordar” com a reafirmação da DER e implantar o benefício dentro do prazo de 45 dias, para afastar sua responsabilidade pelos juros de mora e honorários sucumbenciais.

É necessário conferir ao sistema jurídico integridade (compatibilidade com os diversos enunciados) e coerência (julgar casos iguais mediante semelhante raciocínio), conforme estabelece o art. 926 do CPC. Para confortar e demonstrar a viabilidade de aplicação da coerência e integridade como vetores de racionalização: AgRg nos EAREsp 86.915-SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 26/2/2015, DJe 4/3/2015.

Escrito por Diego Henrique Schuster

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Bah1: TRF4, AC 5060620-22.2016.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 20/10/2020.

Bah2: Conferir as excelentes críticas da presente obra ao atual sistema de aplicação de precedentes no Brasil: STRECK, Lenio; ABBOUD, Georges. O que é isto – o precedente judicial e as súmulas vinculantes? 2 ed. Porto Alegre: 2014.

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