BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE: A PERÍCIA MÉDICA PRECISA SEGUIR ALGUM PADRÃO

 

Analisando algumas ações de concessão de benefício por incapacidade fiquei com a sensação de que a resposta dos peritos não segue um padrão capaz de ser replicado. Isso porque são poucos os que descrevem os testes realizados com o periciando. Assim, por exemplo, uma segurada com problemas de coluna. Os testes especiais da região sacroilíaca são: teste de patrick ou fabere, teste de gaenslen e teste de compressão e distração sacroilíaca.

Apesar de sua autonomia, não podemos concordar que o perito não esteja vinculado a padrões. Como advogado, acho que devemos exigir que o perito descreva os testes realizados já nos quesitos, em busca de critérios seguros e controláveis, ou seja, como referência para o comportamento das partes que compõem a relação processual.

Outra coisa que chama atenção são os argumentos que, no plano hermenêutico, não passam por um teste de verificabilidade. Assim, podemos colocar uma negação face a um discurso ou a uma afirmativa em face de uma negação em busca de respostas adequadas. Lenio Streck explica melhor. “Se dissermos que “chove lá fora”, esse enunciado pode ser falso ou verdadeiro, bastando colocar a partícula ‘não’ e olhar para fora. Com isso, verifica-se que o enunciado ‘chove lá fora’ é falso. Entretanto, se dissermos – utilizando um exemplo que Luis Alberto Warat (1995ª, p. 41) trazia frequentemente – que ‘os duendes se apaixonam em maio’, esse enunciado é impossível de ser verificado.[1]

Nos laudos médicos do INSS é muito comum: “cuidados pessoais adequados, unhas feitas”. Qual á relevância dessa afirmação? A falta de cuidados pessoais é um indício de incapacidade para o trabalho, em razão de dores na coluna? O que dizer de uma pessoa vaidosa? Aqui, se colocarmos a partícula “não”, nada se altera. É, pois, óbvio que devemos contextualizar os quesitos e respostas do perito se quisermos levar isso adiante. Ainda, “pensamento adequado, humor e afeto adequados atitude normal durante pericia”. Mais uma qualidade ou característica que se baseia na aparência do sujeito. Isso pode ser importante naqueles casos em que alegada uma doença psiquiátrica. Afinal, o que o perito espera do seu paciente? Não estamos diante de pré-juízos falsos/inautênticos, tal como presumir que mãos calejadas são prova da capacidade para o trabalho, e que, por isso, devem ser desmascarados?

Tem coisas que só podem ser ditas nos autos de um processo judicial, pois, fora dele, sofreriam um forte constrangimento – há uma tradição.[2]

Escrito por Diego Henrique Schuster

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Bah1: STRECK, Lenio Luiz. Dicionário de Hermenêutica: quarenta temas fundamentais da Teoria do Direito à luz da Crítica Hermenêutica do Direito. Belo Horizonte: Letramento, 2017. p. 261.

Bah2: É como já vi dizer o Professor Lenio Streck: "Por exemplo, pode “decidir” que um filé bovino é uma costela, mas só pode fazer isso nos autos de um processo judicial; já no açougue, não. Ali – no açougue – há uma tradição".


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