TEMAS REPETITIVOS 995 E 1018/STJ: VARIAÇÕES SOBRE O MESMO TEMA NA JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

 

A jurisprudência está muito longe de fornecer todas as respostas. No entanto, já existe luz no fim do túnel (e não é um trem na contramão)! Vejamos algumas situações com sinalização positiva na jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

1. Nos casos em que o benefício postulado na justiça é reconhecido mediante reafirmação de DER, isso afasta a incidência do Tema 1018/STJ?

O Tema Repetitivo 1018/STJ somente poderá ser afastado quando a reafirmação de DER ultrapassar a data do benefício concedido na via administrativa. Se antes disso, o autor tem garantida a possibilidade de manutenção do benefício concedido na via administrativa e, concomitantemente, a execução dos atrasados do benefício postulado/concedido na justiça. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TEMA 1018 DO STJ. APLICABILIDADE. REAFIRMAÇÃO DA DER. É permitida a execução de parcelas atrasadas de benefício concedido judicialmente, mesmo que mediante reafirmação da DER, em caso de ser deferido ao autor, no curso da ação, benefício administrativo mais vantajoso, conforme tese fixada no Tema 1018 do STJ. (TRF4, AG 5034465-92.2023.4.04.0000, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 13/03/2024)

2. Os Temas Repetitivos 1018 e 1050 são (in)compatíveis?

Os Temas 1018 e 1050, ambos do Superior Tribunal de Justiça, não se excluem, pelo contrário, eles suplementam-se mutuamente e podem, além disso, reforçar um ao outro, aumentando as possibilidades e prestigiando o direito.[1]

No Tema Repetitivo 1018, o Superior Tribunal de Justiça buscou restabelecer o equilíbrio das forças, bem assim considerar o ônus da demora. Assim, o precedente de observação obrigatório tem como fundamentos determinantes:

a) o segurado foi obrigado a permanecer trabalhando em razão da atuação descomprometida da autarquia previdenciária, logo, manter o benefício concedido na via administrativa significa prestigiar o esforço adicional desempenhado pelo segurado;

b) a percepção dos atrasados significa prestigiar a correta aplicação do Direito ao caso concreto e, também, justificar a movimentação do aparato judiciário.

Note-se que o Tema Repetitivo 1050, igualmente, vem prestigiar o trabalho do advogado. O que confirma tal impressão é a aplicação do princípio da causalidade, já que o indeferimento do pedido na via administrativa deu causa à demanda previdenciária, devendo, portanto, ser fixados honorários de sucumbência. O Código de Processo Civil estabelece que a base de cálculo para a fixação dos honorários advocatícios é o valor da condenação, o qual é verificado ao final da ação. Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. TEMA 1018 E 1050 DO STJ. PAGAMENTO DAS PARCELAS DO BENEFÍCIO JUDICIAL, ATÉ A DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO ADMINISTRATIVO MAIS VANTAJOSO. 1. É cabível o prosseguimento da percepção do benefício mais vantajoso concedido administrativamente no curso da ação e receber as diferenças do benefício concedido judicialmente até o dia imediatamente anterior à concessão do benefício na via administrativa. 2. Caso em que deve ser aplicada a tese de repercussão fixada no Tema 1.050 do STJ, por analogia, uma vez que os valores devidos nos autos após a DER do benefício concedido administrativamente não serão executados, diante da opção de manutenção deste benefício, na forma definida no Tema 1.018 do STJ. 3. A expressão "valor da condenação", usada no arbitramento da verba honorária, representa todo o proveito econômico obtido pelo autor com a demanda, independentemente de ter havido opção do autor de permanecer com o benefício concedido administrativamente no curso da ação. (TRF4, AG 5000638-56.2024.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 24/04/2024)

3. E quando a DER for reafirmada para uma data anterior ao ajuizamento da ação?

No julgamento do AgInt no REsp 2.018.250/RS, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça definiu que, quando a reafirmação de data de citação ocorrer para um momento anterior ao ajuizamento da ação previdenciária, a DER deve ser fixada na data da citação válida — e com ela os efeitos financeiros.

Isso significa que, para o Superior Tribunal de Justiça, o Tema 995 só aproveita a ação em curso. O Tema Repetitivo 995/STJ trata, acima de tudo e, sobretudo, da tese do fato superveniente, uma questão processual.

A primeira coisa que se deduz de duas coisas é que não são a mesma coisa. Em sendo assim, é possível a aplicação da jurisprudência do TRF4, que faz a distinção entre o  momento do implemento dos requisitos ensejadores do benefício, vale sublinhar: antes e depois do término do processo administrativo.

O Tribunal Federal Regional da 4ª Região aplica a data do implemento dos requisitos, quando ainda pendente o processo administrativo. Esse é o posicionamento da Terceira Seção.[2] Para entender:

A tese firmada não exclui a possibilidade de se reafirmar a DER para momento anterior à propositura da demanda. 4. Nos casos de reafirmação da DER para data anterior ao ajuizamento da ação, quando ainda pendente de conclusão o processo administrativo, a DIB e os efeitos financeiros do benefício devem ser fixados no momento do implemento dos requisitos, ainda que o direito venha a ser reconhecido no curso do processo. 5. As diretrizes traçadas pelo STJ ao julgar os embargos de declaração opostos ao acórdão do Tema 995, quanto aos juros de mora e à verba honorária, não se aplicam às hipóteses em que o direito da parte autora à concessão do benefício se constitui anteriormente à propositura da demanda. 6. O afastamento da condenação do INSS em honorários somente seria possível caso o objeto da demanda fosse, exclusivamente, o pedido de reafirmação da DER. Havendo pedido de reconhecimento de tempo especial e/ou rural, com relação ao qual se insurgiu o réu, dando causa ao ajuizamento da ação, deverá o INSS arcar com os ônus da sucumbência, não havendo afronta ao princípio da causalidade. (TRF4, AC 5009980-76.2016.4.04.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 15/12/2021)

Tal orientação sugere que o segurado ajuíze sua ação na pendência de uma resposta do INSS, e não durante o curso de algum prazo, vale dizer: sob pena de renúncia ao direito de recorrer.

Abre-se um parêntese para dizer que tal orientação representa uma (quase) punição para o segurado que demorar para ajuizar a ação previdenciária após o término do processo administrativo; ou seja, se não preenchidos os requisitos ensejadores do benefício na pendência do processo administrativo, o termo inicial do benefício será fixado somente a partir da data de ajuizamento da ação e ou data da citação do INSS, conforme orientação do STJ. Logo, quanto mais tempo o segurado demorar para ajuizar a ação previdenciária, maior o risco de perder atrasados.

Seja como for, a distinção feita pelo TRF4 pode servir como distinção para a decisão do STJ (AgInt no REsp 2.018.250/RS), a fim de garantir os efeitos financeiros desde o implemento os requisitos do benefício, caso reafirmada a DER para uma data anterior ao ajuizamento da ação, quando ainda pendente de conclusão o processo administrativo. Tal entendimento vai ao encontro da orientação adotada pelo INSS, na via administrativa.

Se durante o curso do processo administrativo o segurado fechar os requisitos ensejadores de um benefício mais vantajoso (e isso não foi verificado), cabe pedir a revisão, conforme Portaria DIRBEN/INSS nº 993, de 28 de março de 2022, no seu art. 33:

Art. 33. Em se tratando de análise inicial de requerimento de benefício de aposentadoria, na hipótese de reconhecimento do direito a mais de uma aposentadoria na DER, deverá ser oferecida ao segurado a opção pelo benefício que seja mais vantajoso.

§ 1º O disposto no caput se aplica às situações em que for implementado o direito a mais de uma aposentadoria em momento posterior à DER até a data do despacho do benefício - DDB, devendo ser oferecido ao segurado a possibilidade de reafirmação da DER para esta data, observado que ela deve ser anterior a DDB.

§ 2º Se durante a análise do requerimento inicial for verificado que na DER o segurado não satisfazia os requisitos para o reconhecimento do direito, mas que os implementou em momento posterior até a DDB, deverá o servidor informar ao interessado sobre a possibilidade de reafirmação da DER para esta data, observado que ela deverá ser anterior a DDB, exigindo-se, para sua efetivação, a expressa concordância por escrito ou por meio digital com validação de acesso por senha, como no Portal “Meu INSS”.

O INSS tem o dever de apurar a melhor fórmula de cálculo, o que compreende uma verificação da data em que preenchidos os requisitos ensejadores preenchimento os requisitos ensejadores do benefício, para efeitos de reafirmação de DER.

Existem outras situações em discussão na jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

d) quando a concessão do benefício mais vantajoso, na via administrativa, não se deu no curso da presente ação, mas no que se dirigia a ela (antes do ajuizamento do da ação judicial). A situação atrai a incidência do Tema Repetitivo 1018/STJ?

e) o benefício mais vantajoso é concedido mediante o aproveitamento (averbação) de períodos incontroversos reconhecidos na justiça - como fica o Tema 1018/STJ?

f) se a ação for julgada totalmente improcedente, é possível a aplicação do Tema Repetitivo 995/STJ, para conceder o benefício?

Rapidamente, o que se defende em relação aos três temas: (i) o benefício mais vantajoso foi concedido enquanto o segurado esperava o reconhecimento do seu direito desde a DER, ou seja, já se projetava a ação judicial. É possível se afirmar que o benefício mais vantajoso foi concedido durante a ação judicial, já que a ação judicial começa com o requerimento administrativo, nos termos do Tema 350/STF[3]; (ii) um benefício que, mesmo que concedido sem tal aproveitamento, é posteriormente submetido a uma revisão, para inclusão dos períodos reconhecidos na justiça; (iii) o segurado não tem como prever qual a extensão da procedência do pedido inicial na justiça (e.g.: quais os períodos que serão reconhecidos como especiais), de modo que seja possível saber se o preenchimento dos requisitos ensejadores do benefício ocorrerá na DER. Nessa situação, o Poder Judiciário não estaria fazendo as vezes da administração previdenciária.

Segundo José Antonio Savaris, a tutela dos direitos fundamentais exige mais da função jurisdicional do que o exame de submissão do ato administrativo à legalidade: “O que importa é a definição de relação jurídica de proteção social e, a partir dela, entregar à parte o bem da vida nos precisos termos a que faz jus. Saber se a parte tem o direito e desde quando tem o direito é o alvo principal da função jurisdicional”.[4]

Post Scriptum1: Já deitei muita tinta sobre esses temas, com cada um dos tópicos sendo trabalhados em diferentes artigos (espalhados pelo blog e no Conjur), além dos meus dois últimos livros. Após a brilhante palestra do jurista Tiago Kidricki, no "Congresso Previdenciário Virtual SOS RS", realizado no dia 10/05/2024,  trazendo um panorama das decisões do tribunal envolvendo o tema, fiquei empertigado com a ideia de colocar tudo em perspectiva para discernir os fundamentos determinantes e contribuir para a reflexão. Aprendi com o Professor Wilson Engelmann que é na relação do dito e pensado que se desvela o não dito e não pensado, então, a (re)combinação das palavras e sentido permite um salto de significado e compreensão. 

Post Scriptum2: Outro ponto importante é esclarecer que a tese do fato superveniente é questão apreciável de ofício, conforme arts. 493 e 933 do CPC, logo, a matéria não se submete aos efeitos preclusivos, tampouco devolutivos da apelação. Agora, é melhor não arriscar e sempre fazer constar tal pedido, com especial atenção para o momento em que o alcance da procedência estiver desnuviado!

 

Bah1: A tese firmada: “O eventual pagamento de benefício previdenciário na via administrativa, seja ele total ou parcial, após a citação válida, não tem o condão de alterar a base de cálculo para os honorários advocatícios fixados na ação de conhecimento, que será composta pela totalidade dos valores devidos.”

Bah2: AR n. 2009.04.00.034924-3, Rel. Des. Federal Celso Kipper, julgada em 06-09-2012.

Bah3: AGRAVO INTERNO. TEMA 503/STF. TEMA 563/STJ. TEMA 1018/STJ. DISTINÇÃO. RECURSO ESPECIAL. REMESSA DOS AUTOS AO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Reconhecida a distinção do caso em relação à moldura fática dos Temas 503/STF, 563/STJ e 1018/STJ, o agravo interno interposto contra a decisão que negou seguimento ao recurso especial deve ser provido para que os autos sejam encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, na forma do § 12 do art. 1.037 do CPC. (TRF4, AG 5039711-06.2022.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 02/07/2023)

Bah4: SAVARIS, Jose Antonio. Princípio da primazia do acertamento judicial da relação jurídica de proteção social. Disponível em: www.univali.br/periodicos. Acesso em 02 out. 2020.


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