LAUDO TÉCNICO DE INSALUBRIDADE, LTCAT E PPRA: O SEQUESTRO DA DIFERENÇA E OS PREJUÍZOS AOS SEGURADOS

 

A partir da Lei 9.732/98, que emprestou nova redação ao art. 58, da Lei 8.213/91, tem-se a exigência de que o Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT), com base no qual é preenchido o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), a ser fornecido pelo segurado, como um dos meios de prova da atividade especial, observe os termos da legislação trabalhista, como é o caso da Norma Regulamentar (NR) 15, expedida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Para José Antonio Savaris, a insalubridade previdenciária parece coincidir agora com a insalubridade trabalhista, ainda que a doutrina previdenciária possa ter uma leitura diferente daquela operada pela trabalhista.[1]

A questão é realmente complexa quando comparamos o laudo técnico de insalubre, o Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho e o PPRA, na tentativa de se demonstrar tais coincidências. Apesar de todos contemplarem agentes físicos, químicos ou biológicos, a diferença entre os documentos expõe a fragilidade dos formulários, muitas vezes, tomados como prova absoluta no processo previdenciário.

Entre o laudo técnico de insalubridade e o LTCAT, fica claro que o primeiro é referente à legislação trabalhista e o segundo à legislação previdenciária. Assim, se considerarmos apenas o LTCAT, vamos perceber que muitos agentes nocivos acabam ficando de fora, uma vez que tal documento deve ser preenchido com base no Dec. 3.048/99. A periculosidade caracteriza-se por atividades que ponham em risco a vida do trabalhador. Como o LTCAT é um documento previdenciário, não cabe concluir sobre a periculosidade. Para os profissionais da área, a periculosidade é colocada muitas vezes no LTCAT erroneamente.[2] O laudo técnico trabalhista, por sua vez, vai contemplar a periculosidade, com fundamento na NR-16.

O mesmo vale para agentes químicos, segundo orientações seguidas pelos profissionais da área:

Nos casos de elaboração do laudo de insalubridade, verifique nos anexos 11 e 12 da NR-15 se existe a indicação do limite de exposição do agente químicos. Se não houver o limite, não é possível classificar a atividade em questão como insalubre, exceto aquelas que qualitativamente se enquadram no anexo 13, que dependem do julgamento profissional.[3]

Quando a substância não estiver presente em nenhum dos anexos, o empregador não precisa se preocupar com o pagamento do adicional de insalubridade, já que não presente na NR-15. Agora, se for um PPRA, em que pode ser utilizado a ACGIH, é possível o enquadramento, pois este é um programa de prevenção de doenças ocupacionais, dando margem à formação de vínculos com o futuro. A NR-9 trata especificamente do PPRA. Mesmo ausente na ACGIH, é possível ao profissional buscar informações em outras literaturas a fim de que a saúde do trabalhador seja protegida, o que coincide com a finalidade do benefício da aposentadoria especial.[4] É importante lembrar que o PPRA é aceito em substituição ao LTCAT.

Nessa perspectiva, portanto, a insalubridade trabalhista nem sempre coincide com a previdenciária. Laudo de insalubridade, PPRA e LTCAT possuem objetivos diferentes. Este último consegue ser o pior dos três documentos, quer seja em termos de prevenção/proteção, quer seja em termos de comprovação da especialidade das atividades exercidas pelo trabalho. É de se ver que procede a impugnação do formulário PPP, quando o segurado alega omissão em relação a agentes não previstos no Dec. 3.048/99. O sequestro dessa diferença (entre os laudos) pode gerar prejuízos para o reconhecimento do benefício de aposentadoria especial, mormente quando indeferida a prova pericial, como se verá no meu livro.

Em resumo, o LTCAT seria somente para a instrução de aposentadoria especial, contemplando apenas os agentes previstos no Anexo IV do Decreto 3.048/1999. Por sorte, o STJ “bagunçou” com tal orientação, admitindo a possibilidade de se reconhecer a especialidade com base em outros agentes nocivos - não previstos nos decretos previdenciários -, conforme REsp 1.306.113/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14.11.2012, DJe 07.03.2013 – Representativo da Controvérsia – Tema 534.

 

Escrito por Diego Henrique Schuster

___________________________________

Bah1: SAVARIS, José Antonio. Direito processual previdenciário. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2011. p. 255. Sérgio Pinto Martins entende que “não necessariamente, a aposentadoria especial irá coincidir com as pessoas que recebem adicionais de remuneração. Exemplo seria o adicional de periculosidade, o pagamento do adicional pode ser um indício à aposentadoria especial”. (MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 367). Adriane Bramante de Castro Ladenthin dá o exemplo dos trabalhadores de um pólo petroquímico, que fazem jus ao adicional de periculosidade, pois o perigo iminente de explosão, e anota: “Claro que receber o adicional representa um indício de ter havido exposição, mas essa prova isolada, sem nenhuma outra complementar, não se presta para o reconhecimento do período como especial”. (LADENTHIN, Adriane Bramante de Castro. Aposentadoria especial: teoria e prática. Curitiba: Juruá, 2013. p. 74-75). Vale lembrar que o Ministério da Economia incorporou o Ministério do Trabalho e Emprego.

Bah2: MAGALHÃES, Leandro Assis. 101 perguntas e respostas sobre agentes químicos para Higiene Ocupacional: um guia de cabeceira para não errar nas avaliações de campo. 2. ed. São Paulo: Editora Lux, 2020. p. 71.

Bah3:A insalubridade está normatizada na NR-15, que são atividades e as operações insalubres. Os agentes presentes nos anexos 11 e 12 possuem limites de tolerância, logo, a exposição deve ultrapassar os limites de tolerância. Já as atividades e operações descritas no anexo 13, a caracterização é por meio de avaliação qualitativa. MAGALHÃES, Leandro Assis. 101 perguntas e respostas sobre agentes químicos para Higiene Ocupacional: um guia de cabeceira para não errar nas avaliações de campo. 2. ed. São Paulo: Editora Lux, 2020. p. 70-74.

Bah4: O governo alemão possui um banco de dados de limites de substâncias químicas muito bom, chamado GESTIS. No link é possível se encontrar limites de exposição em vários países. Também há os limites recomendados pelo NIOSH (NIOSH RELs) e os recomendados pela AIHA (AIHA WEELs). O link é <http://limitvalue.ifa.dguv.de/>. Acesso em: 09 fev. 2021.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PRIMEIRAS IMPRESSÕES SOBRE A DECISÃO PROFERIDA EM SEDE DE ED: TEMA 1.102/STF

REVISÃO DA VIDA TODA: VAMOS INTERPRETAR/COMPREENDER PARA DECIDIR?

A EQUIVOCADA APLICAÇÃO DO TEMA 629/STJ: ESTAMOS INVERTENDO AS COISAS