Mensagem ao Jovem Advogado

 

Não tenho a pretensão de escrever uma carta aos advogados previdenciaristas, embora a distância me permita fazê-lo. Se fosse preciso escrever uma mensagem significativa, com lições para jovens advogados, deveria ser a de meus erros e arrependimentos...

Não falo para ninguém, mas com vocês. Sim, entre advogados previdenciaristas existe uma espécie de comunidade ou irmandade, o sucesso do IBDP é a maior prova disso. Assim sendo, ajudar um colega é tão ou mais legal do que lutar as próprias batalhas. Isso porque o dano a um segurado é sempre um dano a toda uma visão social que merece o Direito Previdenciário.

Sei o que todos queremos e, por isso, sei também o que nos une, mormente aqueles que estão no front. Quando um advogado combate a discricionariedade-arbitrariedade, quando ele faz valer direitos conquistados a duras penas, ele dá esperança a todos!

Antes de prosseguir, quero me desviar por um instante do caminho. Assusta-me o advogado que não age de outra maneira a não ser como o advogado – talvez seja inveja minha. Talvez ele oculte de si mesmo o horror da profissão. É quando lembro de frases como: “A advocacia não é profissão de covardes”. Seria importante reconhecermos os medos que se escondem atrás desse rótulo.

O problema é quando somos compelidos a ignorar as próprias necessidades ...quando somos, em razão da profissão, desencorajados a manifestar emoções. O preço disso torna-se alto e muitos colegas estão adoecendo. Todos temos medos, então, não fique com eles só para você.

A perfeição está fora do alcance da humanidade, fora do alcance da advocacia. Em cada momento luminoso de felicidade há uma gota de veneno: o conhecimento de que as derrotas virão.

Nesse mundo confuso e perturbado, nunca vai existir uma resposta perfeita. No Direito não existe um “sentido último”, ou seja, estamos sempre rolando a pedra até alto da montanha, de onde ela torna a cair (tal como no Mito de Sísifo). Mas somos advogados, e com ela já estamos apostando corrida!

A nossa generosidade consiste, justamente, em aceitar inteiramente a regra do jogo – não o jogo da razão, em que muitos caem na prepotência das verdades absolutas – o que não significa resignação. Aliás, a indignação nos confere um poder real – quem faz sustentação oral sabe do que estou falando!

Mas, também aqui, quero falar com aquele advogado que se culpa por não estar nas capas de revistas especializadas. Lembre-se que o trabalho da formiguinha, aquele que (quase) ninguém vê, está lá, fazendo a diferença na vida de alguém. Ter consciência disso é suficiente para aquele que busca o verdadeiro, e não o desejável.

Em tempos onde se sacrifica tudo pela aparência, em que tudo é feito só para os olhos, agrada-me o ser heroico de um jeito muito discreto. A propósito, “De todas as glórias, a menos enganosa é a que se vive.” (Albert Camus)

Para quem está pensando em desistir, lembre-se que 9 editoras rejeitaram o primeiro livro de Harry Potter!

Para terminar, eu gostaria de acrescentar mais uma coisa: eventos como estes são para aqueles que não perderam ou desejam recuperar o encantamento pelo estudo, o resto é consequência....

O mundo muda e nós mudamos com ele. Agora, você só muda quando sabe o que quer. Não se trata de uma meta a ser atingida ou coisa parecida, mas estar sempre disposto a reaprender a ver, a fazer de cada caso um lugar privilegiado, um lugar no qual você se reconhece como parte, e não mero espectador. O mundo nos escapa porque nos perdemos tentando achar respostas prontas, cursos que tentam explicar todas as coisas por uma só, enfim, “piloto automático não leva a lugar nenhum” (HG)!

Em tempos de inteligência artificial é sempre bem-vinda a reflexão: advogado robô ou robô advogado? Nem um nem outro. Assim como a dogmática jurídica, o robô não questiona, sendo que o Direito nada mais é – e, por isso, muito – do que as interrogações feitas pelo intérprete da lei, no caso concreto, à luz do Direito (que não cabe na lei), como aprendi com o Professor Lenio Streck! A ausência da filosofia no e do Direito é a marca dessa crise de compreensão.

Compreender o fenômeno não é reduzi-lo ao Direito. Concordamos com Eros Grau, quando aduz que “algumas questões reclamam o manejo de noções, e não somente de conceitos”. É assim no futebol, digo, o juiz que estudar somente as regras do jogo não vai entender aquilo que faz parte do próprio jogo, logo, o contato físico será sempre um problema (se me entendem a ironia)!

Gostaria muito de estar com todos vocês, mas, nem por isso, deixaremos de ligar pontos no horizonte. Sorte a minha ter muitos amigos! Parabéns ao IBDP e a todos congressistas.

Este Congresso mostra que vale a pena – sem que a pena seja castigo – apostar nos estudos. Mais do que isso, vale a pena levar o Direito a sério. Fica aqui a minha (quase) oração: “fazei de nós instrumentos, para "amar e mudar as coisas” (Belchior)! Ah, quase esqueço, honestidade intelectual e a humildade séria, sempre!

Escrito para o XVIII Congresso Brasileiro de Direito Previdenciário do IBDP.

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