AÇÃO RESCISÓRIA NO TEMA 810/STF: DA INEXIGIBILIADE DO TÍTULO EXECUTIVO À AÇÃO RESCISÓRIA
Diego Henrique Schuster*
Resumo: O
presente trabalho analisa as
inovações trazidas pelos parágrafos
13, 14 e 15, do art. 525 e 6º, 7º e 8º, do 535, com especial atenção para a
ação rescisória. Para tanto, busca-se encontrar uma justificação na tese da
“coisa julgada inconstitucional”, tendo a discussão como recorte descritivo o julgamento do RE 870.947
(Tema 810 da repercussão geral no STF).
Palavras-chave: Ação Rescisória. Tema 810/STF. Decadência.
Súmula 343/STF.
1. Introdução
As
dúvidas são muitas e dependem de uma decisão que olhe para a teoria: nem sempre
reconhecida na prática, a doutrina desempenha um papel importante quando se
tenta entender a prática.
O presente
artigo versa sobre a ação rescisória prevista, de forma expressa, no § 15 do
art. 525 e no § 8º do art. 535 do CPC, tendo a discussão como recorte
descritivo o tema 810/STF. Com efeito, o STF declarou a Lei 11.960/09 inconstitucional,
logo, os títulos executivos baseados nela podem ser impugnados na via da ação
rescisória, com pedido de execução complementar referente a diferença entre a correção
monetária pela TR e pelo IPCA-E (INPC).
Em seu
desenvolvimento, o artigo será divido em quatro partes, sem qualquer
pretensão de se esgotar o tema.
Na primeira, serão feitos alguns esclarecimentos preliminares,
a fim de bem contextualizar a diferença entre a impugnação em sede de
cumprimento de sentença, passando pela execução complementar naqueles casos em
que diferida para a fase
de cumprimento de sentença a definição dos consectários legais aplicáveis às
prestações vencidas, até a ação rescisória contra decisão que aplicou a TR e
transitou em julgado antes da decisão do STF. Na segunda, ganha destaque a
novidade trazida pelos artigos supramencionados, com especial atenção para o termo
inicial do prazo decadencial (bienal). Na terceira, é analisado o cabimento da
ação rescisória no tema 810/STF frente à Súmula 343/STF (“Não cabe ação rescisória por ofensa a literal
disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal
de interpretação controvertida nos tribunais.”). Na quarta e última, a pergunta
que não quer calar: ao segurado (exequente) é possível a impugnação e eventual
ação rescisória com fundamento em lei declarada inconstitucional pelo STF (Tema 810), valendo-se
dos arts. 525 e 535 do CPC/2015 (aceitos – normalmente –
como matéria de defesa do executado)?
2. O que cabe antes e depois do trânsito
em julgado da decisão que aplicou a TR mais
juros de poupança?
O julgamento do RE
870.947 (Tema 810 da repercussão geral no
STF) foi finalizado na sessão de 20.09.2017, com
publicação do acórdão em 20.11.2017. A decisão do STF que
conferiu efeito suspensivo aos embargos declaratórios foi prolatada em 24.09.2018.
O julgamento dos embargos foi concluído no dia 03-10-2019,
consoante extrato de ata do RE 870.947 disponível no Portal do STF, sem
modulação de efeitos - que tem como finalidade minimizar os resultados nefastos das reviravoltas da jurisprudência. A decisão transitou em julgado em 03/03/2020.
Apesar da tese
determinar a aplicação do IPCA-E, a variação observada em razão do julgamento do Tema
905 é a seguinte:
- IGP-DI de 05/96
a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da
Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei
8.213/91)
Assim, naqueles casos em que a decisão – que
determinou a aplicação TR mais juros de poupança – transitou em julgado
antes do julgamento do STF será exigida uma ação rescisória. Se a decisão
transitou depois da decisão do STF será possível a correção em sede de
cumprimento de sentença. Da mesma forma, naqueles casos em que diferida para a
fase de cumprimento se sentença a forma de cálculo dos consectários legais. Nesse sentido:
PROCESSUAL
E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
CORREÇÃO MONETÁRIA. TEMA 810 DO STF. ACÓRDÃO EXEQUENDO. DISCUSSÃO
ATRAVÉS DE IMPUGNAÇÃO. INTELIGÊNCIA DA TESE FIRMADA PELO STF NO TEMA 733 E NA
ADI 2.418. ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA. TEMA 810 DO STF E 905 DO STJ. O
acórdão exequendo foi proferido de em desacordo com a decisão prolatada no
julgamento do Tema 810 do STF. De acordo
com a exegese da tese firmada no Tema 733 do STF em conjunto com o entendimento
firmado no julgamento da ADI 2.418, a inexiquibilidade do título ou
inexigibilidade da obrigação poderá ser alegada em sede de impugnação de
sentença quando a decisão de inconstitucionalidade do Supremo Tribunal Federal
for anterior ao trânsito em julgado da sentença. Concluído o julgamento dos EDs do Tema 810 em
03-10-2019, deve prosseguir a execução, pelos índices estabelecidos pelo STJ,
INPC, quando da análise do Tema 905, pois este foi proferido após o julgamento do
mérito do Tema 810 pelo STF, afastando-se, por consequência, o índice declarado
inconstitucional pelo Pretório Excelso (TR). (TRF4, AG
5003830-36.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO
AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 21/07/2020)
Mesmo após sentença de extinção da
execução (em relação à execução do valor incontroverso), será possível o
prosseguimento da execução, com o pagamento de crédito remanescente, na forma de execução
complementar. Neste contexto, "não há que se falar em preclusão da
possibilidade de prosseguimento da execução, porquanto, a rigor, era
processualmente inviável o reconhecimento do pagamento integral do crédito
exequendo". Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO
DE SENTENÇA. PENDÊNCIA DE RESOLUÇÃO DO TEMA 810/STF. PAGAMENTO COMPLEMENTAR. Tendo
sido determinado que a diferença entre a TR e o INPC seria paga após a
resolução do Tema 810/STF, é possível o prosseguimento da execução quanto ao
crédito remanescente, não ocorrendo a preclusão a respeito pela sentença
extintiva quando ao valor incontroverso. (TRF4, AG
5034383-66.2020.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator JULIO GUILHERME BEREZOSKI
SCHATTSCHNEIDER, juntado aos autos em 18/09/2020)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
ÍNDICE DA TR. CUMPRIMENTO COMPLEMENTAR COM A APLICAÇÃO DO TEMA 810 JULGADO PELO
STF. PRECLUSÃO. AFASTAMENTO. Como no momento do cumprimento da sentença o
índice fixado na sentença era a TR, diferindo para a fase de execução a
observância do que viesse a ser definido no Tema 810 do STF, não há falar
em preclusão, uma vez que à parte só cabia concordar com o índice da TR e, como
dito no acórdão, aguardar decisão do STF sobre o Tema. (TRF4, AG
5019688-10.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator para
Acórdão LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 09/09/2020)
Em assim
sendo, nos casos em que diferida para a fase de cumprimento de sentença a
definição dos consectários legais aplicáveis às prestações vencidas, com
aplicação dos índices da Lei 11.960/2009 apenas de forma provisória, a
pretensão da parte autora - adequação do título ao julgamento do Tema 810 STF,
no que diz respeito ao índice de correção monetária - pode e deve ser
buscada junto ao juízo competente para a execução complementar.[1]
No entanto, o que mais perto nos
interessa são os critérios para o ajuizamento da ação rescisória, com especial
atenção para a Súmula 343/STF e o termo inicial da decadência, este último numa
relação de direito intertemporal.
3. Do cabimento da Ação Rescisória e o
termo inicial do prazo decadencial
Existem instrumentos – alguns
limitados – capazes de relativizar a força da coisa julgada no ordenamento
jurídico brasileiro, quais sejam, a ação rescisória, a ação anulatória,[2] a impugnação nos cumprimentos de sentença,[3] a impugnação por erro material ou erro de
cálculo,[4] a impugnação de sentença inconstitucional,[5] a coisa julgada secundum eventum probationis nas demandas coletivas[6] e, até mesmo,
a reclamação.[7] Oportunas as considerações dos
juristas Humberto Theodoro Júnior
e Juliana Cordeiro de Faria:
Enfim, não se trata – é bom advertir – de enfrentar o
instituto da coisa julgada, mas de evitar uma visão sectária que insiste em
mantê-lo num pedestal sacro e intocável, maior do que a ordem constitucional
lhe concede. Na verdade, o problema é dos limites da própria figura da coisa
julgada. Assim como há casos tradicionais em que o esgotamento das
possibilidades recursais não impede a renovação do pleito sobre a mesma lide
(lembre-se da ação civil depois da ação penal improcedente por insuficiência de
prova, da nova ação popular depois que a primeira malogrou por falta de provas,
das ações civis públicas, nas mesmas circunstâncias, da ação ordinária após o
mandado de segurança denegado por não comprovação de direito líquido e certo,
de sentença passada em julgado sem citação do revel, etc.), também a sentença
que agride a Constituição não merece adquirir a plena autoridade da coisa
julgada em seu feitio material. Transitado em julgado, segundo a lei
processual, porque já não há mais possibilidade de impugná-la pelas vias
recursais. Não se reveste, entretanto, da intangibilidade própria das sentenças
não mais atacáveis por meio dos recursos ordinários ou extraordinários. O caso
é de nulidade ipso iure, que nem a res iudicata pode superar.[8]
A desconstituição da coisa julgada não
decorre de uma pretensão moral de correção da decisão, uma vez que os critérios
para se resolver a questão estão no próprio sistema. Segundo o art. 966 do novo
Código de Processo Civil será admitida a revisão da decisão transitada em julgado
sempre que estivermos diante de um defeito tão grave que, fazer vistas grossas
seria altamente prejudicial à legitimidade do ordenamento jurídico e da
prestação jurisdicional, por trazer instabilidade às relações jurídico-sociais.[9]
É cabível a ação rescisória com base
nas hipóteses taxativamente previstas no art. 966 do CPC, estando o prazo
decadencial previsto no § 2º do art. 975. Na hipótese de prova nova, o
termo inicial do prazo será a data de descoberta desta prova, observado o prazo
máximo de cinco anos, contados do trânsito em julgado da última decisão
proferida no processo. Na vigência do CPC/73, Cassio Scarpinella Bueno já sugeria a
relativização do artigo 495 [“O Direito de propor ação rescisória se extingue
em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão”], de forma a
permitir a contagem do prazo decadencial a partir do descobrimento do fato que
poderá contestar o meio de controle da coisa julgada.[10]
A propósito do
tema, a 3ª Seção do TRF4, por unanimidade, entendeu que o alargamento do
prazo decadencial previsto no art. 975, § 2º, do CPC/2015, não é aplicável às
rescisórias que objetivem desconstituir decisões transitadas em julgado sob a
égide do antigo CPC (até 16/03/2016), isto é, não há como ser aplicado retroativamente
o regramento especial estabelecido pela nova legislação processual civil.[11]
No que diz
respeito às demais hipóteses autorizadoras da ação rescisória, o prazo
decadencial é de dois anos a contar do trânsito em julgado da última decisão
proferida no processo, conforme Súmula 401 do Superior Tribunal de Justiça.
Frise-se, nesse ponto, que o art. 966, § 3º, do CPC/2015 sinaliza em parte para
a teoria dos capítulos da sentença, ao afirmar que: “a ação rescisória pode ter
por objeto apenas (um) capítulo da decisão”. Ora, como é cediço, a referida
súmula foi editada no regime anterior.
O CPC/2015, no § 8 do art. 525 e no §
8º do art. 535, prevê o manejo de ação rescisória no caso de coisa julgada
inconstitucional. De forma expressa, o CPC dispõe que o prazo decadencial terá
como marco inicial o trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF conforme
os §§ 15 e 8º, dos arts. 525 e 535, do CPC/2015.
Art. 525. [...]
§ 12. Para efeito do disposto no inciso III do § 1º deste artigo,
considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo
judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo
Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do
ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição
Federal , em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
§ 13. No caso do § 12, os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal
poderão ser modulados no tempo, em atenção à segurança jurídica.
§ 14. A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 12 deve ser
anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda.
§ 15. Se a decisão referida
no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá
ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão
proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante
judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30
(trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir:
[...]
§ 5º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste
artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título
executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional
pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei
ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com
a Constituição Federal , em controle de constitucionalidade
concentrado ou difuso.
[...]
§ 8º Se a decisão referida no § 5º for proferida após o trânsito em
julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será
contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal
Federal.
Então, de cara, isso é uma novidade. Dentro
da excepcionalidade da ação rescisória, temos, portanto, uma situação excepcionalíssima.
O prazo decadencial deixa de ter como termo inicial o trânsito em julgado da
decisão rescindenda para iniciar a contar do trânsito em julgado da decisão
proferida pelo Supremo Tribunal Federal
(decisão paradigma). Segundo Arnaldo Esteves Lima, trata-se de mecanismo diferente:
Poder-se-á dizer, tomando-se a expressão emprestada do
direito administrativo funcional, que tal lapso constitui como que um “estágio
probatório”, a que se submete a res judicata, a qual, no curso de
tais prazos, subsiste com certo grau de relatividade, já que poderá vir a ser
alvo de uma pretensão rescisória, nas hipóteses legal e taxativamente
previstas. Operada a decadência, no entanto, sobrevirá a denominada coisa
soberanamente, ou definitivamente, julgada. Tal se dá nas circunstâncias
normais de aplicação do Direito, concretamente. A sua relativização,
contudo, tese bem mais recente, configura mecanismo diferente, pois de
aplicação mais do que excepcional, excepcionalíssima, podendo ocorrer mesmo
após o decurso do referido biênio, em hipóteses restritíssimas.
E na sequência, aduz:
Tais normas referem-se, conforme Capítulos III
e V, do Livro I, ao ‘Cumprimento Definitivo da Sentença que Reconhece a
Exigibilidade de Obrigação de Pagar Quantia Certa’, e ‘Do Cumprimento de
Sentença que Reconhece a Exigibilidade de Obrigação de Pagar Quantia Certa pela
Fazenda Pública’. São, pois, especiais, específicas, cujos sujeitos ativos de
eventual Ação Rescisória, na hipótese, podem ser particulares (pessoa natural
ou jurídica) ou entes públicos, componentes de quaisquer das unidades que
integram a Federação, conforme a natureza da obrigação a ser cumprida. Tal
ocorrerá se se fizerem presentes, concretamente, os pressupostos inscritos nos
dispositivos transcritos. A contar do trânsito em julgado da decisão do STF,
inicia-se o biênio para eventual ação rescisória.
[...]
É oportuno registrar que o cabimento de
rescisória com fundamento no § 15, do art. 525, ou no § 8º, do art. 535,
são novidades e
não foram inseridos no elenco previsto no art. 966, tendo a virtude de
reforçar, valorizar a coisa julgada, pois a despeito da constitucionalidade ou
inconstitucionalidade declarada pelo STF, que fora inobservada pela decisão
exequenda, esta prevalecerá definitivamente caso não seja, em tal biênio, alvo
de rescisória, com êxito. É, sem dúvida, avanço na proteção da segurança jurídica,
além da paz social.[12]
Trata-se da denominada “coisa julgada
inconstitucional”. Sobre tal mecanismo, com previsão dada pela Lei
11.232/2005, que incluiu os arts. 475-L, §1º, e 741, parágrafo único, do CPC/1973,
Teori Albino Zavascki discorre sobre quais as sentenças inconstitucionais que
poderão ser desconstituídas:
São apenas três,
portanto, os vícios de inconstitucionalidade que permitem a utilização do novo
mecanismo: (a) a aplicação de lei inconstitucional; ou (b) a aplicação da lei a
situação considerada inconstitucional; ou, ainda, (c) a aplicação da lei com um
sentido (= uma interpretação) tido por inconstitucional. Há um elemento comum
às três hipóteses: o da inconstitucionalidade da norma aplicada pela sentença.
O que as diferencia é, apenas, a técnica utilizada para o reconhecimento dessa
inconstitucionalidade. No primeiro caso (aplicação da lei inconstitucional),
supõe-se a declaração de inconstitucionalidade com redução de texto. No segundo
(aplicação da lei em situação tida por inconstitucional), supõe-se a técnica da
declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto. E no terceiro
(aplicação de lei com um sentido inconstitucional), supõe-se a técnica da
interpretação conforme a Constituição.[13]
Compartilhamos da preocupação exposta pela
Desembargadora Federal Taís Schilling Ferraz:[14]
A insegurança jurídica gerada pela possibilidade de que muitos anos após
o trânsito em julgado de uma ação individual, seja possível a reversão do
decidido, porque o STF decidiu, num caso paradigma, de forma diversa sobre o
tema constitucional, será confrontada com a necessidade do tratamento isonômico
dos destinatários da norma, exigindo dos julgadores difícil ponderação de
valores, bem como a eventual definição de regras mínimas de modulação de
efeitos, de forma a preservar atos praticados com base na estabilidade gerada
por uma decisão judicial que fez coisa julgada.
O Supremo Tribunal Federal fixou, no
Tema 360 da repercussão geral, a seguinte tese:
São constitucionais as disposições normativas do parágrafo único do art.
741 do CPC, do § 1º do art. 475-L, ambos do CPC/73, bem como os correspondentes
dispositivos do CPC/15, o art. 525, § 1º, III e §§ 12 e 14, o art. 535, § 5º.
São dispositivos que, buscando harmonizar a garantia da coisa julgada com o
primado da Constituição, vieram agregar ao sistema processual brasileiro um mecanismo com eficácia rescisória de
sentenças revestidas de vício de inconstitucionalidade qualificado, assim
caracterizado nas hipóteses em que (a) a sentença exequenda esteja fundada em
norma reconhecidamente inconstitucional – seja por aplicar norma
inconstitucional, seja por aplicar norma em situação ou com um sentido
inconstitucionais; ou (b) a sentença exequenda tenha deixado de aplicar norma
reconhecidamente constitucional; e (c) desde que, em qualquer dos casos, o
reconhecimento dessa constitucionalidade ou a inconstitucionalidade tenha
decorrido de julgamento do STF realizado em data anterior ao trânsito em
julgado da sentença exequenda.
A legitimidade
constitucional do parágrafo único do art. 741 do CPC, cuja redação original
adveio da MP 2.180-35/2001 e que
foi modificado pela Lei 11.232/2005, foi recentemente examinada pelo Plenário,
no julgamento da ADI 2418, de relatoria do Min. Teori Zavascki, julgamento
encerrado em 4.5.2016. Oportuna a
transcrição do seguinte trecho:
No regime do CPC/73, não havia distinção entre ser o precedente anterior
ou superveniente à sentença exequenda. Mas é claro que, se o precedente do STF
tiver sido anterior (como agora dispõe o § 14 do art. 525 do CPC/15), fica
evidenciado, mais claramente, o desrespeito à autoridade da Suprema Corte. No
atual regime (CPC/15), se a decisão do STF, sobre a inconstitucionalidade, for
superveniente ao trânsito em julgado da sentença exequenda, ‘caberá ação
rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida
pelo Supremo Tribunal Federal’.
No julgamento do RE 586.068, a Suprema
Corte indicou que é
possível a aplicação do artigo 741 do CPC/73, até mesmo, no âmbito dos JEF’s,
ainda que funcionem em procedimento diferenciado. Conclui-se que o STF foi além
da Súmula 487 do STJ: “O parágrafo único do
art. 741 do CPC não se aplica às sentenças transitadas em julgado em data
anterior à da sua vigência.”
Teresa Arruda Alvim Wambier e José
Miguel Garcia Medina entendem que, no caso de decisão de inconstitucionalidade,
nem mesmo a ação rescisória é necessária, pois a decisão é juridicamente
inexistente. O interesse de agir, em casos como esse, nasceria não da
necessidade, mas da utilidade de uma decisão nesse sentido, que tornaria
indiscutível o assunto, sobre o qual passaria a pesar autoridade de coisa
julgada.[15]
Por outro lado, o Código de Processo
Civil de 2015 traz, de forma expressa, norma de direito intertemporal para
aplicação desses dispositivos: “Art. 1.057. O disposto no art. 525, §§
14 e 15 , e no art. 535, §§ 7º e 8º , aplica-se às decisões
transitadas em julgado após a entrada em vigor deste Código, e, às
decisões transitadas em julgado anteriormente, aplica-se o disposto no art.
475-L, § 1º , e no art. 741, parágrafo único, da Lei nº 5.869, de 11
de janeiro de 1973”.
Destarte, a data do trânsito em julgado da decisão rescindenda determina
qual o diploma a ser aplicado e, consequentemente, o prazo decadencial a ser
observado. Se na vigência do CPC/2015, será possível não apenas o alargamento
do prazo decadencial, no caso de ainda não ter escoado, mas a reabertura do prazo
decadencial. Não havendo
questão constitucional, aplicam-se as regras dos §§ 2º e 3º do art. 975,
ou seja, a ação rescisória sujeita-se ao prazo decadencial de dois anos a
contar do trânsito em julgado da decisão rescindenda. Havendo questão
constitucional, pois, o prazo bienal deverá iniciar na data em que transitada
em julgado a decisão judicial do STF. Humberto Theodoro Júnior ratifica:
No caso de sentença baseada em lei ou ato normativo
considerado inconstitucional pelo STF, ou fundada em aplicação ou interpretação
da lei ou do ato normativo tido pelo STF como incompatível com a Constituição,
em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso, a lei dispensa a
rescisória, podendo a inexigibilidade da obrigação respectiva ser arguida em
simples impugnação ao cumprimento da sentença (NCPC, art. 525, § 12). A regra,
todavia, exige que a decisão do STF tenha acontecido antes do trânsito em
julgado do aresto exequendo (art. 525, § 14). Se tal decisão tiver sido
proferida após ao trânsito em julgado, o caso será de ação rescisória e, não,
de simples impugnação. Nessa hipótese, o prazo decadencial para o
ajuizamento da rescisória começará a fluir a partir do trânsito em julgado do
julgamento do STF (art. 525, § 15).[16]
Assim, para o bem ou para o mal, a contagem do prazo decadencial deve observar o disposto no art. 525, § 12 c/c § 15, e no art. 535, §§ 5º e 8º, todos do CPC. O direito intertemporal designa a disciplina jurídica que deve ser observada.
4. A aplicação da Súmula 343 nas ações rescisórias contra a coisa
julgada inconstitucional
Quando o assunto é aplicação da Súmula
343 do STF (“não cabe rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando
a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação
controvertida nos tribunais”), é difícil apontar, na jurisprudência, padrões e
critérios que possam ser replicados.
Afastando
a decisão rescindenda lei posteriormente declarada constitucional, ou,
declarada a inconstitucionalidade da norma que serviu de fundamento para a
decisão rescindenda atacada, a ação rescisória deverá ser admitida, por lei. Com
efeito, entende-se pela inaplicabilidade do enunciado do STF.
A
uma, porque o seu cabimento está previsto nos §§
15 e 8º, dos arts. 525 e 535, do CPC/2015. No tema 733/STF, o Supremo
Tribunal Federal sinalizou para o cabimento de ação rescisória:
[...] a decisão do
Supremo Tribunal Federal declarando a constitucionalidade ou a
inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a automática reforma ou
rescisão das sentenças anteriores que tenham adotado entendimento diferente;
para que tal ocorra, será indispensável a interposição do recurso próprio ou,
se for o caso, a propositura da ação rescisória própria, nos termos do art. 485,
V, do CPC, observado o respectivo prazo decadencial (CPC, art. 495).
Ressalva-se desse entendimento, quanto à indispensabilidade da ação rescisória,
a questão relacionada à execução de efeitos futuros da sentença proferida em
caso concreto sobre relações jurídicas de trato continuado.
A
duas, inexistindo posição da Magna Corte ao tempo da decisão rescindenda ou,
mesmo existindo, sendo ela reafirmada de forma definitiva pelo STF, não se
aplica a Súmula 343/STF. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal já tinha posicionamento contrário à utilização da Taxa
Referencial como índice de correção monetária antes de tal orientação ser
reafirmada na ultimação do julgamento do Tema 810 da repercussão geral. Nesse
sentido:
AGRAVO EM AÇÃO
RESCISÓRIA. JULGAMENTO LIMINAR DE IMPROCEDÊNCIA. DESCONSTITUIÇÃO DA COISA
JULGADA. DECISÃO FIRMADA EM TEXTO LEGAL DE INTERPRETAÇÃO CONTROVERTIDA NOS
TRIBUNAIS. SÚMULA 343 DO STF. APLICABILIDADE. 1. Ainda que o
pronunciamento do Pretório Excelso no julgamento do RE nº 590.809 esteja sujeito
a controvérsia acerca da extensão da tese estabelecida em regime de repercussão
geral - se aplicável apenas à alteração de posicionamento do próprio STF ou a
qualquer controvérsia jurisprudencial -, é inarredável a conclusão de que
não mais se admite o manejo da ação rescisória quando houver interpretação
controvertida nos Tribunais, ainda que se trate de questão constitucional. 2.
Interpretando o paradigma do STF, a Corte Especial do TRF4, na sessão de
26-10-2016, firmou orientação de que não se aplica a Súmula STF nº 343 apenas
aos casos em que, à época da decisão rescindenda, inexistente posição da Magna
Corte que conformasse o entendimento então adotado. (TRF4
5052930-96.2016.4.04.0000, Rel. Gabriela Pietsch Serafin, Terceira Seção, j.
05.12.2017).
A
didática da exposição justifica a longa transcrição de trecho da decisão
proferida na Ação Rescisória 5021709-56.2020.4.04.0000, de relatoria do Des. Osni
Cardoso Filho:
No julgamento das
ADI 4.357 e 4.425, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do
art. 100, §§ 9º e 10, da Constituição Federal, com a redação dada
pela Emenda Constitucional nº 62/2009, bem como da expressão ‘na data
de expedição do precatório’, contida no § 2º, e das expressões
"índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança" e
"independentemente de sua natureza", constantes no § 12, todos
do art. 100 da CF, com as alterações da EC nº 62/2009. Por arrastamento,
foi também declarada a inconstitucionalidade parcial do art. 1º-F da
Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/2009
(Relator Ministro Ayres Britto, Relator para Acórdão Ministro Luiz Fux,
Tribunal Pleno, julgado em 14/03/2013).
Conforme a ementa dos
julgados, depreende-se que foi afastada a correção monetária dos precatórios
segundo o índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, objeto
da alteração realizada no art. 100 da Constituição Federal pela EC nº 62/2009.
No tocante aos juros moratórios, a decisão alcança somente os débitos de
natureza tributária inscritos em precatório, devido à violação do princípio
constitucional da isonomia, decorrente da incidência de juros no mesmo
percentual aplicado à caderneta de poupança. Logo, a inconstitucionalidade
parcial por arrastamento do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a
redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/2009, tem a mesma extensão do que
foi decidido em relação à Emenda Constitucional nº 62/2009: a) o índice oficial
de remuneração da caderneta de poupança não é aplicável para fins de
atualização monetária dos precatórios; b) os juros de mora
dos débitos de natureza tributária inscritos em precatório devem
observar os mesmos juros incidentes sobre os créditos tributários.
Em questão de ordem,
a Corte Suprema modulou os efeitos das decisões nas ADI 4.357 e 4.425, mantendo
a aplicação do índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança
(TR) para os precatórios expedidos ou pagos até 25 de março de 2015. Para
os precatórios posteriores a essa data, o IPCA-E foi fixado como índice de
correção monetária, salvo os de natureza tributária, que devem ser atualizados
pelos mesmos critérios de correção monetária e juros de mora dos créditos
tributários (ADI 4.425 QO, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno,
julgado em 25/03/2015).
A controvérsia
decorrente da interpretação conferida pelos tribunais inferiores no sentido de
que a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 5º da Lei nº
11.960/2009, declarada nas ADI 4.357 e 4.425, implicava o afastamento da
incidência da TR na atualização monetária, em momento anterior à expedição
do precatório, levou o STF, em 16 de abril de 2015, a admitir a
repercussão geral da questão atinente à validade
jurídico-constitucional da correção monetária e dos juros moratórios incidentes
sobre condenações impostas à Fazenda Pública, segundo os índices oficiais de
remuneração básica da caderneta de poupança (Tema nº 810).
Conclui-se, pois, que
a rescisória não esbarra no óbice da Súmula nº 343 do STF, já
que inexistiam decisões reiteradas do STF ou precedente vinculante na
época em que a sentença rescindenda foi proferida. Cabe analisar,
então, se houve a alegada violação a literal disposição de lei.[17]
Tivesse
o STF orientação prévia favorável à utilização
da Taxa Referencial, coincidindo com a decisão rescindenda, não seria cabível a
ação rescisória. No quadro capturado pela jurisprudência do Tribunal Regional
da 4ª Região:
NORMA DECLARADA
INCONSTITUCIONAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL |
||
Existe
posição prévia contrária à decisão rescindenda |
A
posição prévia é reafirmada no julgamento da repercussão
geral |
Deve
ser afastada a Súmula 343/STF |
Inexiste
posição prévia contrária |
A
orientação no julgamento da repercussão geral é contrária à decisão
rescindenda |
Deve
ser afastada a Súmula 343/STF |
Existe
posição prévia coincidindo com a decisão rescindenda |
A
posição prévia NÃO é reafirmada no julgamento da repercussão geral e é contrária à decisão rescindenda |
Deve
ser aplicada a Súmula 343/STF |
Na
verdade, o que vem pesando a orientação fornecida no julgamento do Recurso
Extraordinário 590.809, no sentido de que o verbete 343 deve ser observado em
situação jurídica na qual: “inexistente controle concentrado de
constitucionalidade, haja entendimentos diversos sobre o alcance da norma, mormente quando o Supremo tenha sinalizado,
num primeiro passo, óptica coincidente com a revelada na decisão rescindenda”.
No plano constitucional, contudo,
concorda-se que uma vez invocado o inciso V do art. 966 do CPC, “o Tribunal
não se escusará de julgar o mérito da rescisória a pretexto de existir
controvérsia na jurisprudência. A questão constitucional teria de ser
enfrentada, para se afirmar a interpretação da norma debatida, que não poderia
persistir no estágio de dúvida e imprecisão”.[18]
Enfim, seja pela inexistência de posição, seja pela posição
prévia contrária à utilização da Taxa Referencial como índice de correção
monetária (ADI 4.357
e 4.425), é cabível a ação rescisória, porquanto
a decisão rescindenda contraria a orientação do STF. No plano constitucional
tem que haver uma resposta adequada à Constituição, não sendo possível mais de
uma interpretação sobre a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei
nº 9.494/1997.
5. Matéria de defesa exclusiva do executado (Fazenda Pública): somente
ao executado servem os artigos 525 e 535 do CPC?
Outro argumento conhecido é de que os arts. 525 e 535
versam apenas sobre matéria de defesa do executado, como um privilégio do
devedor. Uma coisa são os meios de defesa do executado; outra, bem distinta, é
a ação rescisória em face da coisa julgada inconstitucional. O processo de
execução foi pensado para não ter cognição sobre o crédito objeto da demanda em
seu bojo. A ação rescisória constitui uma ação autônoma:
destinada
precipuamente a obter rescisão da coisa julgada formada sobre decisão judicial,
permitindo a partir daí a revisão do julgado. Note-se que o objeto da ação rescisória
e desconstituir a força da coisa julgada, já que a sentença transitada em
julgado presume-se, até prova em contrário, válida e eficaz – tanto é assim que
a simples propositura da ação rescisória não impede o cumprimento da decisão
rescindenda (art. 969).[19]
A lei admite expressamente a ação rescisória
contra decisão exequenda que transitou em julgado antes da decisão do STF. É
indiscutível que o escopo da ação rescisória é atacar a coisa julgada
inconstitucional. Trata-se de mais “um mecanismo de afirmação das decisões do
STF em controle de constitucionalidade e na interpretação das normas
constitucionais.” [20]
Sobre a decisão que se fundamentou em
lei posteriormente declarada inconstitucional pelo STF, Humberto Theodor Júnior[21]
anota:
Certo é que a declaração de inconstitucionalidade opera efeitos
retroativos. Vale dizer, é como se alei nunca tivesse integrado o sistema
jurídico. Entretanto, razões ‘de segurança jurídica ou efeitos de excepcional
interesse social’ podem levar o STF a restringir os efeitos da declaração ou
‘decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de
outro momento que venha a ser fixado’ (Lei 9.8686/1999, art. 27). Não havendo a
modulação de efeitos pelo STF, é perfeitamente possível a rescisória, uma vez
que ‘a lei inconstitucional não produz efeito, nem gera direito, desde o seu
início’. Todavia, se a Corte Superior determinar que a inconstitucionalidade
se operar ex nunc, não se poderá utilizar a rescisória para desconstituir a
decisão fundamentada na lei declarada inconstitucional.[22]
Os dispositivos supramencionados também se aplicam para os
exequentes/credores, tendo em vista que o próprio ministro Luix Fux suscitou (no
item 2 do seu voto nos ED) o art. 525, §13º do CPC para defender a modulação de
efeitos, no sentido de não aplicar o precedente a decisões já transitadas em
julgado. Como sublinho, no âmbito do julgamento dos Embargos de Declaração
do Tema 810, o ministro, que havia relatado o acórdão de mérito, propôs a
seguinte solução: “(...) 2. O acórdão embargado não alcança os provimentos
judiciais condenatórios que transitaram em julgado, cujos critérios de
pagamento serão mantidos.”
Contudo, o Tribunal seguiu o voto do ministro Alexandre de
Moraes (relator p/ acórdão nos Embargos de Declaração), que afastou
qualquer espécie de modulação de efeitos, admitindo, pois, a possibilidade de a
decisão alcançar os provimentos judiciais condenatórios que transitaram em
julgado:
QUATRO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE
FUNDAMENTAÇÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO. REJEIÇÃO. REQUERIMENTO DE MODULAÇÃO DE
EFEITOS INDEFERIDO. 1. O acórdão embargado contém fundamentação apta e
suficiente a resolver todos os pontos do Recurso Extraordinário. 2. Ausentes
omissão, contradição, obscuridade ou erro material no julgado, não há razão
para qualquer reparo. 3. A respeito do requerimento de modulação de efeitos do
acórdão, o art. 27 da Lei 9.868/1999 permite a estabilização de relações
sociais surgidas sob a vigência da norma inconstitucional, com o propósito de
prestigiar a segurança jurídica e a proteção da confiança legítima depositada
na validade de ato normativo emanado do próprio Estado. 4. Há um juízo de
proporcionalidade em sentido estrito envolvido nessa excepcional técnica de
julgamento. A preservação de efeitos inconstitucionais ocorre quando o seu
desfazimento implica prejuízo ao interesse protegido pela Constituição em grau
superior ao provocado pela própria norma questionada. Em regra, não se admite o
prolongamento da vigência da norma sobre novos fatos ou relações jurídicas, já
posteriores à pronúncia da inconstitucionalidade, embora as razões de segurança
jurídica possam recomendar a modulação com esse alcance, como registra a
jurisprudência da CORTE. 5. Em que pese o seu caráter excepcional, a experiência
demonstra que é próprio do exercício da Jurisdição Constitucional promover o
ajustamento de relações jurídicas constituídas sob a vigência da legislação
invalidada, e essa CORTE tem se mostrado sensível ao impacto de suas decisões
na realidade social subjacente ao objeto de seus julgados. 6. Há um ônus
argumentativo de maior grau em se pretender a preservação de efeitos
inconstitucionais, que não vislumbro superado no caso em debate. Prolongar a
incidência da TR como critério de correção monetária para o período entre 2009
e 2015 é incongruente com o assentado pela CORTE no julgamento de mérito deste
RE 870.947 e das ADIs 4357 e 4425, pois virtualmente esvazia o efeito prático
desses pronunciamentos para um universo expressivo de destinatários da norma. 7.
As razões de segurança jurídica e interesse social que se pretende prestigiar
pela modulação de efeitos, na espécie, são inteiramente relacionadas ao
interesse fiscal das Fazendas Públicas devedoras, o que não é suficiente para
atribuir efeitos a uma norma inconstitucional. 8. Embargos de declaração
todos rejeitados. Decisão anteriormente proferida não modulada. (RE 870947 ED,
Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal
Pleno, julgado em 03/10/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-019 DIVULG 31-01-2020
PUBLIC 03-02-2020)
Qual seria o efeito prático do pronunciamento do
STF, mormente em sede de embargos de declaração, caso se concorde que os arts.
525 e 535 somente servem para embasar direitos dos devedores? Nem a impugnação
de título executivo inconstitucional nem a ação rescisória com prazo
decadencial a contar do trânsito em julgado da decisão do STF seria cabível, em
razão de serem matérias de defesa exclusiva do executado?
Concordar com tal entendimento significa dizer
que o tema 810 não se aplica a decisões que transitaram em julgado. Não foi
para isso que o STF se debruçou sobre a questão da modulação dos efeitos da
decisão, prevista nos §§ 13, do art. 525, e 6º, do art. 535, do CPC/2015.
Assim, não tem cabimento o INSS alegar que
somente ao executado seria possível ajuizar uma ação rescisória com prazo contado
do trânsito em julgado da decisão do STF.
Como já se viu, é possível, em sede de
cumprimento de sentença, a aplicação da nova orientação naqueles casos em que a
decisão que aplicou a TR transitou em julgado depois da decisão do STF. Ali não se fez nenhuma distinção entre
exequente e executado, autor e INSS ou credor e devedor, na ação originária.[23] Por outras palavras, servindo os artigos 525
e 535 para embasar a impugnação de título executivo que contraria interpretação
do STF, também o deverão servir para embasar a rescisão do julgado.
Segundo Taís Schilling Ferraz[24]:
As mesmas
justificativas invocadas para a admissibilidade das ações rescisórias podem ser
trazidas como fundamentos para o reconhecimento da inexigibilidade de título
inconstitucional. A disposição legal já existia perante o CPC/73 e foi
introduzida após a consolidação da jurisprudência sobre a rescindibilidade de
sentença assentada sobe interpretação constitucional divergente da firmada pelo
STF.
A norma seria flagrantemente inconstitucional sob a
interpretação de que apenas à Fazenda Pública assiste o prazo decadencial com
marco inicial desde o trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal. É, pois, gritante, a violação ao princípio da igualdade. Nem num alto nível de
abstração se poderia concordar com isso. Não há circularidade em interpretar
uma lei supondo que ela não deva atender ao princípio da igualdade. Isso não se
relaciona com o princípio da segurança jurídica.[25]
6. Considerações finais
Não digo
que isso seja ruim. Digo, simplesmente, que é assim, vale dizer: o CPC/2015, no
§ 15 do art. 525 e no § 8º do art. 535,
prevê, de forma expressa, o manejo de ação rescisória no caso de coisa julgada
inconstitucional, adotando como marco inicial do prazo decadencial para a
propositura o trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF. O que
não se pode perder de vista é a segurança jurídica. Tornar absoluta a possibilidade de ajuizamento da ação rescisória, a qualquer
tempo, coloca séria dúvidas sobre a noção de segurança jurídica, mormente no
sentido de estabilidade. Daí a importância da modulação de efeitos, a fim de
determinar o cabimento e alcance da ação rescisória. É preciso justificá-la
indiretamente com base em seus efeitos práticos.[26]
Da execução contra a Fazenda Pública à
defesa na ação de execução, o que está em questão é a “coisa julgada
inconstitucional”, logo, a ação rescisória se apresenta como um mecanismo de afirmação das decisões do STF em
controle de constitucionalidade e na interpretação das normas constitucionais,
o que conspira em favor da conclusão de que para o exequente (no tema 810) deverá
ser aplicado o mesmo marco inicial do prazo decadencial para eventual ação
rescisória.
Referências
ASSIS, Araken de. Processo civil brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015,
V. 3. Parte especial: procedimento comum (da demanda à coisa julgada).
BUENO,
Cassio Scarpinella. Curso sistematizado
de direito processual civil. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva,
2012, v. 2: Procedimento comum: ordinário e sumário.
FERRAZ, Taís Schilling. O precedente na jurisdição constitucional:
construção e eficácia do julgamento da questão com repercussão geral. São
Paulo: Saraiva, 2017.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Coisa
julgada e terceiros: notícia histórica. Revista
Magister de Direito Civil e Processual Civil. Porto Alegre, ano 2, v. 12,
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LIMA, Arnaldo Esteves. Comentários
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<https://www.conjur.com.br/2019-set-04/arnaldo-lima-relativizacao-coisa-julgada-acao-rescisoria?fbclid=IwAR2ro3YER3gaC1aMdsVt7aE-kNmgXDxHMnBanJyqDEItCxbpwGkXoomCUfA>.
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MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sério
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STF, Pleno, Rcl
509/MG, Rel. Sepúlveda Pertence, AC.
17.12.1999, DJU 04.08.2000.
RE 328812 ED, Relator(a): GILMAR MENDES,
Tribunal Pleno, julgado em 06/03/2008, DJe-078
DIVULG 30-04-2008 PUBLIC
02-05-2008 EMENT VOL-02317-04 PP-00748
RTJ VOL-00204-03 PP-01294 LEXSTF v. 30, n. 356, 2008, p. 255-284.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil -
execução forçada, processos nos tribunais, recursos e direito intertemporal.
vol. 3. 49. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE
INSTRUMENTO - 5012830-24.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ DE
LIMA STEFANINI, julgado em 07/08/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/08/2020.
TRF-3, AR
nº 5022223-70.2019.4.03.0000, Terceira Seção, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento,
v.u., j. 18/03/2020, DJe 23/03/2020.
TRF4, ARS
5021709-56.2020.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado
aos autos em 03/08/2020.
TRF4, ARS
5026637-84.2019.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, juntado aos
autos em 22/04/2020.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José
Miguel Garcia. O dogma da coisa julgada.
São Paulo: RT, 2003.
ZAVASCKI,
Teori Albino. Inexigibilidade de sentenças inconstitucionais. In: DIDIER JR,
Fredie (coord.). Relativização da coisa julgada: enfoque crítico. Salvador:
Juspodivm, 2006.
* Mestre em Direito Público e Especialista em Direito Ambiental pela Universidade do Vale do Rio dos
Sinos - UNISINOS; Diretor-Adjunto
da Diretoria Científica do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário –
IBDP; Vencedor do I Concurso
Nacional de Teses Previdenciárias - CNTP; Advogado
e pesquisador da Lourenço e Souza Advogados Associados; Palestrante e autor de
vários artigos jurídicos. Autor de vários
livros, entre eles: “Aposentadoria especial: entre o princípio da precaução e a
proteção social”, publicado pela editora Juruá. Email:
vidareal33@bol.com.br.
[1] Essa é orientação seguida pela 3ª
Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: TRF4, ARS
5026637-84.2019.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, juntado aos
autos em 22/04/2020.
[2] Art. 966, §4, do CPC.
[3] Artigos 525, § 1º, I, e 535, I, do
CPC.
[4] Art. 494, I, do CPC.
[5] Art. 525, § 12, e
535, § 5º, do CPC.
[6] Vale destacar os
artigos 16, da Lei da Ação Civil Pública, 18, da Lei da Ação Popular, e 103,
incisos I e II, do Código de Direito do Consumidor: “Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da
competência territorial do órgão prolator, exceto
se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em
que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento,
valendo-se de nova prova”. “Art. 18.
A sentença terá eficácia de coisa julgada oponível "erga omnes",
exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de
prova; neste caso, qualquer cidadão
poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova”.
“Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará
coisa julgada: I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de
provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico
fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo
único do art. 81; II – ultra partes, mas limitadamente ao
grupo, categoria ou classe, salvo
improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior,
quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art.
81”. (grifo nosso). Situação praticamente
idêntica é na ação popular, para a qual Araken de Assis defende que o instituto
da coisa julgada pode ser analisado secundum
eventum litis quando as demandas forem julgadas improcedentes por
insuficiência de provas, não produzindo coisa julgada, igualmente sendo
possível qualquer indivíduo, inclusive o autor, demandar novo processo se
obtiver uma prova nova. (ASSIS, Araken de. Processo civil brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015,
V. 3. Parte especial: procedimento comum (da demanda à coisa julgada), p.
1496). Ada Pellegrini Grinover compartilha o
entendimento de Araken de Assis, destacando que na ação popular, quando esta é
improcedente por falta de material probatório, não se opera a coisa julgada. (GRINOVER,
Ada Pellegrini. Coisa julgada e terceiros: notícia histórica. Revista Magister de Direito Civil e
Processual Civil. Porto Alegre, ano 2, v. 12, p. 12, mai./jun. 2006).
[7] “Ajuizada a reclamação antes do
trânsito em julgado da decisão reclamada, e não suspenso liminarmente o
processo principal, a eficácia de tudo quanto nele se decidir ulteriormente,
incluído o eventual trânsito em julgado do provimento que se tacha de contrário
à autoridade do STF, será desconstituído pela procedência da reclamação” (STF,
Pleno, Rcl 509/MG, Rel. Sepúlveda Pertence, AC. 17.12.1999, DJU 04.08.2000).
[8] THEODORO JÚNIOR, Humberto; FARIA, Juliana Cordeiro de.
Reflexões sobre o princípio da intangibilidade da coisa julgada e sua
relativização. In: DELGADO, José
Augusto; NASCIMENTO, Carlos Valder (Org.). Coisa julgada inconstitucional. Belo
Horizonte: Fórum, 2008.
[9] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART,
Sério Cruz; MITIDIERO, Daniel. O novo processo civil. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2015. p. 572.
[10] BUENO, Cassio
Scarpinella. Curso sistematizado de
direito processual civil. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva,
2012, v. 2: Procedimento comum: ordinário e sumário, p. 449.
[11] “[...] Tratando-se de alteração no
prazo para propor a ação rescisória, é necessário investigar qual a
situação jurídica apanhada pela nova lei. Se o prazo para ajuizar a rescisória
já havia se escoado sob a égide do antigo CPC, é descabido cogitar a aplicação
da lei nova a fatos já consumados. Se o direito de propor a rescisória
ainda não havia decaído, o novo prazo estabelecido pela legislação
processual pode ser aplicado às rescisórias ajuizadas após a entrada em vigor
da Lei nº 13.105/2015. 3. No caso em que a novel legislação diminuiu o
prazo decadencial, não é aplicável, sob pena de ofensa ao direito adquirido.
Se, ao contrário, ampliou o prazo decadencial, pode ser aplicada, observado o
prazo já decorrido sob a vigência do antigo CPC. 4. O atual CPC instituiu
pressuposto de rescindibilidade diverso, a prova nova, inovando quanto ao
momento da obtenção da prova: após o trânsito em julgado da última decisão
proferida no processo. 5. Tratando-se de rescisória fundada em prova nova, que
visa à desconstituição de sentença transitada em julgado sob a égide do antigo
CPC, é inaplicável o alargamento do prazo decadencial estabelecido no
art. 975, § 2º, do CPC em vigor. 6. Entendimento amparado no Enunciado 341 do
Fórum Permanente de Processualistas Civis: O prazo para ajuizamento de
ação rescisória é estabelecido pela data do trânsito em julgado da decisão
rescindenda, de modo que não se aplicam as regras dos §§ 2º e 3º do art. 975 à
coisa julgada constituída antes de sua vigência. 7. Embora a ação
possa ser admitida com base no inciso VII do art. 485 do antigo CPC (documento
novo), impõe-se reconhecer a decadência do direito para propor a
rescisória, pois foi ultrapassado o prazo de dois anos previsto no antigo CPC”.
(TRF4, AR 0000731-85.2016.4.04.0000, Rel. Márcio Antônio Rocha, Terceira Seção,
D.E. 27/07/2018).
[12] LIMA, Arnaldo Esteves. Comentários sobre relativização da coisa julgada e ação
rescisória. Revista Consultor Jurídico, São
Paulo, 4 setembro 2019. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2019-set-04/arnaldo-lima-relativizacao-coisa-julgada-acao-rescisoria?fbclid=IwAR2ro3YER3gaC1aMdsVt7aE-kNmgXDxHMnBanJyqDEItCxbpwGkXoomCUfA>.
Acesso em: 07 out. 2020.
[13] ZAVASCKI, Teori Albino.
Inexigibilidade de sentenças inconstitucionais. In: DIDIER JR, Fredie (coord.).
Relativização da coisa julgada: enfoque crítico. Salvador: Juspodivm, 2006. p.
333.
[14] FERRAZ, Taís Schilling. O precedente na jurisdição constitucional:
construção e eficácia do julgamento da questão com repercussão geral. São
Paulo: Saraiva, 2017. p. 113.
[15] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA,
José Miguel Garcia. O dogma da coisa
julgada. São Paulo: RT, 2003. p. 43.
[16] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil -
execução forçada, processos nos tribunais, recursos e direito intertemporal.
vol. 3. 49. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 904.
[17] TRF4, ARS 5021709-56.2020.4.04.0000,
TERCEIRA SEÇÃO, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 03/08/2020.
[18] THEODORO
JÚNIOR, Humberto. Curso de direito
processual civil - execução forçada, processos nos tribunais, recursos e
direito intertemporal. vol. 3. 49. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Forense, 2016. p. 860. Nesse sentido: EMENTA: Embargos de Declaração em Recurso
Extraordinário. 2. Julgamento remetido ao Plenário pela Segunda Turma.
Conhecimento. 3. É possível ao Plenário apreciar embargos de declaração opostos
contra acórdão prolatado por órgão fracionário, quando o processo foi remetido
pela Turma originalmente competente. Maioria. 4. Ação Rescisória. Matéria
constitucional. Inaplicabilidade da Súmula 343/STF. 5. A manutenção de decisões
das instâncias ordinárias divergentes da interpretação adotada pelo STF
revela-se afrontosa à força normativa da Constituição e ao princípio da máxima
efetividade da norma constitucional. 6. Cabe ação rescisória por ofensa à
literal disposição constitucional, ainda que a decisão rescindenda tenha se
baseado em interpretação controvertida ou seja anterior à orientação fixada
pelo Supremo Tribunal Federal. 7. Embargos de Declaração rejeitados, mantida a
conclusão da Segunda Turma para que o Tribunal a quo aprecie a ação
rescisória.(RE 328812 ED, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em
06/03/2008, DJe-078 DIVULG
30-04-2008 PUBLIC 02-05-2008 EMENT
VOL-02317-04 PP-00748 RTJ VOL-00204-03
PP-01294 LEXSTF v. 30, n. 356, 2008, p. 255-284).
[19] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART,
Sério Cruz; MITIDIERO, Daniel. O novo processo civil. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2015. p. 572.
[20] FERRAZ, Taís Schilling. O precedente na jurisdição constitucional:
construção e eficácia do julgamento da questão com repercussão geral. São
Paulo: Saraiva, 2017. p. 114.
[21] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil -
execução forçada, processos nos tribunais, recursos e direito intertemporal.
vol. 3. 49. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 862.
[22] No julgamento do Tema 810, o INSS requereu, em
sede de embargos, a modulação dos efeitos da decisão do STF, isto é, para
depois de 25/03/2015, mas esse pedido foi rejeitado, como se verá no capítulo
5.
[23] No mesmo sentido: PROCESSUAL CIVIL E
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA. UTILIZAÇÃO DO MANUAL DE PROCEDIMENTOS PARA
OS CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL EM VIGOR POR OCASIÃO DA EXECUÇÃO DO JULGADO.
RECURSO NÃO PROVIDO. 1. No julgamento do RE nº 870.947 (Tema 810),
com repercussão geral reconhecida, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por
maioria de votos, afastou a aplicação da TR, como índice de correção monetária,
precedente em relação ao qual devem se guiar os demais órgãos do Poder
Judiciário (artigos 927, III e 1.040, ambos do CPC). 2. Em se
tratando da fase anterior à expedição do precatório, e tendo em vista que
não houve modulação dos efeitos do julgado do Supremo Tribunal Federal (RE
nº 870.947), há de se concluir que devem ser aplicados os índices
previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado, em respeito ao
Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005. 3. Agravo interno
não provido. (TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO -
5012830-24.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI,
julgado em 07/08/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/08/2020)
[24] FERRAZ, Taís Schilling. O precedente na jurisdição constitucional:
construção e eficácia do julgamento da questão com repercussão geral. São
Paulo: Saraiva, 2017. p. 114.
[25] A 3ª Seção do
Tribunal Regional Federal da 3ª Região sequer cogitou a possibilidade de o art.
525, §15, do CPC/2015 servir apenas como matéria de defesa do executado:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AGRAVO INTERNO. SUPERAÇÃO
DO PRAZO BIENAL PARA PROPOSITURA DA AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO COM TRÂNSITO EM
JULGADO ANTERIOR À VIGÊNCIA DO CPC/2015. IMPOSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DO ART.
525, §15º, DO CPC/2015. OBSERVÂNCIA DO PRECEITUADO NO ART. 1.057 DO CPC/2015.
OCORRÊNCIA DE DECADÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO, NOS TERMOS DO ARTIGO
332, §1º, DO CPC/2015. I - O prazo decadencial geral, correspondente a 02
(dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no
processo, consoante o disposto no art. 975, caput, do CPC/2015, havia sido
superado no caso em comento, tendo em vista o lapso temporal transcorrido entre
o trânsito em julgado da r. decisão rescindenda (10.02.2016) e o ajuizamento da
presente ação rescisória (30.08.2019). De outra parte, mesmo que fosse
considerado o disposto no art. 495 do CPC/1973, verificar-se-ia igualmente a
superação do prazo decadencial, uma vez que no regime processual civil anterior
o limite temporal para a propositura de ação rescisória também era de 02 (dois)
anos. II - Não obstante a decisão do e. STF no RE 870.947, que apontou ser
inconstitucional a utilização da TR para efeito de correção monetária (Sessão
realizada em 20.09.2017 e publicada em 20.11.2017), restou inviabilizada a utilização
do termo inicial decadencial diferenciado previsto no art. 525, §15, do
CPC/2015, que estabelece seu início a partir do trânsito em julgado da decisão
proferida pelo e. STF, posto que tal possibilidade somente é admissível para as
decisões que transitaram em julgado após a entrada em vigor do CPC/2015
(18.03.2016), o que não ocorreu no caso vertente. III - Não merece
prosperar, outrossim, o argumento do ora agravante no sentido de que são
aplicáveis os preceitos insertos no art. 475-L, §1º e 741, parágrafo único,
ambos do CPC/1973, dado que tais hipóteses de alegação de inconstitucionalidade
encontram lugar em sede de execução, ou em impugnação ou em embargos à
execução, não atingindo o instituto da ação rescisória. Cumpre relembrar que em
face de expressa concordância manifestada pela parte autora, ora agravante, com
os cálculos ofertados pelo INSS, foi decretada a extinção da execução, com
fundamento no art. 924, II, do CPC/2015. IV - Ante a superação do prazo bianual
para propositura da ação rescisória e não sendo admissível na hipótese a
aplicação do art. 525, §15, do CPC/2015, impõe-se a decretação liminar da
improcedência do pedido, na forma prevista no art. 332, §1º, do CPC/2015, em
face do reconhecimento da ocorrência de decadência, com extinção do processo,
com resolução do mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC/2015. V - Agravo
interno da parte autora desprovido.” (TRF-3, AR nº 5022223-70.2019.4.03.0000,
Terceira Seção, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento, v.u., j. 18/03/2020, DJe
23/03/2020)
[26] Tomamos como base o tema 709. As decisões que transitaram em julgado,
assegurando-se a possibilidade de o percipiente de aposentadoria especial
continuar trabalhando sob condições especiais, deverão ser discutidas pela via
da ação rescisória.
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